domingo, abril 28, 2019

Cristo emprestou suas mãos ao cirurgião

A imagem pode conter: 1 pessoa, em péLuana era uma menina do interior de Oriximiná, que subitamente começou a ter fortes dores de cabeça e perder a visão. Os exames mostraram um grande tumor em seu cérebro, localizado profundamente. A retirada cirúrgica oferecia grandes ricos de morte e sequela. Mas o procedimento cirúrgico era a única alternativa capaz de salvar sua vida. 

Durante a cirurgia, a lesão foi saindo suave e facilmente. O tumor foi se soltando das áreas profundas e vitais de seu cérebro e minhas mãos nunca estiverem tão firmes. Parecia que tinham um rumo e ritmo próprio alheios a minha vontade. Uma sensação estranha, como poucas vezes tinha vivido. 


No dia seguinte a cirurgia, Luana abriu o olhos, movimentou braços e pernas e surpreendentemente não apresentava nenhuma sequela grave. Sua mãe, uma senhora humilde que sempre morou no interior de Oriximiná chega comigo e fala: “ doutor, muito obrigado. Sei que o senhor não esperava por este resultado, mas Jesus emprestou as mãos dele para o senhor operar minha filha”.


Agradeci as palavras daquela mãe, mas atribui aquele bom resultado ao acaso. Sempre que alguém evoca alguma figura divina como sendo responsável por um bom ou mau resultado, permaneço com um profundo respeito, mas adoto uma postura poética de Vinicius de Moraes que fala em sua canção: “ e eu que não creio, peço a Deus por minha gente, é gente humilde que vontade de chorar”.

Para mim seria difícil imaginar Jesus sem suas mãos, porque havia emprestado para alguém operar! Crucificado pode ser, mas sem mãos? 

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O resultado da biópsia de Luana revelou que se tratava de um tumor benigno. Ela retornou algumas vezes ao ambulatório, até ser considerada curada. O tempo passou e aquele caso não mais aflorava em minha memória.


Ontem, doze anos depois, em uma viagem de férias a Itália, entrei na Igreja de São Pedro em Gênova. Meu interesse era mais cultural que religioso. Logo que entrei, fiquei impressionado com a beleza do local. Havia um silêncio e um clima de admiração e respeito dos turistas que visitavam. Parei próximo a porta principal da Igreja e quando olhei para minha direita, bem perto de meus olhos, uma escultura de Cristo olhava em minha direção. 


Um frio e arrepio subiu em meu corpo, quando vi que naquela imagem Cristo estava sem as duas mãos! Imediatamente, lembrei do caso da Luana. Ainda sem acreditar no que via, olhei para uma placa a direita da imagem e lá estava escrito: “ Cristo non ha piú mani ha soltanto le nostre mani per fare oggi le sue opere” ( Cristo não tem mais suas mãos e está pedindo que nossas mãos façam hoje a sua ação!). Eram as mesmas palavras daquela mãe do interior de Oriximiná. Teria ela vindo até a Itália, ou seria mais uma coincidência? Cantei um trecho da canção de Vinícius, mas também rezei baixinho por aquela mãe e por meus pacientes. Sem ninguém ver. 

Depois pensei que com a internet todos nós viramos cirurgiões. Nossas mãos, movendo teclados ou tocando em telas, podem levar o bem ou causar o mal. Operar em favor da justiça ou sangrar injurias até a morte. As mãos que outrora moviam enxadas, hoje mudam o mundo com leves movimentos dos dedos. Para os que creem desejo que usem as mãos que faltam em Cristo para fazermos um mundo melhor.

Foto e Texto: Erik L. Jennings Simões
Imagem: Cristo da Igreja de São Pedro, Gênova-Itália.

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