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domingo, agosto 29, 2021

'Não admitiremos qualquer retrocesso' no estado democrático, diz Rodrigo Pacheco em entrevista ao GLOBO

Chefe do Congresso defende respeito às manifestações, mas diz que anseio por ruptura há de ser coibido, e revela contato com Forças Armadas

BRASÍLIA - O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), cancelou a participação em um evento em Viena, na Áustria, para monitorar em Brasília as manifestações de 7 de setembro, insufladas pelo presidente Jair Bolsonaro. Caso seja necessário, ele vai se pronunciar em defesa das instituições, em uma prática que já virou rotina. Pacheco, que na semana passada arquivou um pedido de impeachment apresentado pelo chefe do Executivo contra o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), também virou alvo de críticas, mas prefere não apresentar resposta.

Em entrevista ao GLOBO, ele afirma que não admitirá qualquer retrocesso no sistema democrático e acrescenta que esse também será o papel das Forças Armadas, com as quais tem mantido contato.

O GLOBO: O senhor disse que a rejeição do pedido de impeachment do ministro do STF Alexandre de Moraes seria um “marco do restabelecimento da relação entre os Poderes”. No dia seguinte, Bolsonaro criticou a sua decisão e atacou Moraes. Como será possível retomar a harmonia?

RP: São duas situações. Primeiro, a crítica do presidente da República à decisão de arquivamento do processo de impeachment é natural. Ele teve uma pretensão resistida e indeferida. A segunda parte, que é a manutenção de críticas muito ostensivas à Suprema Corte e aos seus integrantes, realmente não contribuem. Isso dificulta o processo de pacificação institucional que buscamos.

RP: Não. Tenho absoluta certeza de que o pensamento do deputado Arthur Lira (presidente da Câmara) é o mesmo, de apaziguar. Sei também da disposição do ministro Luiz Fux (presidente do STF) de fazer o mesmo. Há uma comunhão de vontades nesse sentido.

O GLOBO: Por que não citou o presidente Bolsonaro entre as autoridades dispostas ao diálogo?

RP: O presidente Bolsonaro tem falado e agido no sentido de afirmar suas próprias convicções. Espero que ele possa contribuir para esse processo de pacificação, porque há inimigos batendo à nossa porta, que não somos nós mesmos, mas a inflação, o aumento do dólar, o desemprego, o aumento da taxa de juros e a crise hídrica e energética, que pode ser avassaladora. É importante que tenhamos um freio naquilo que não interessa para cuidar do que importa ao Brasil.

O GLOBO: Quando falou com o presidente pela última vez?

RP: Estive com ele (Bolsonaro) muito rapidamente no Dia do Soldado, em um evento no Exército. Falei com ele na véspera do dia do desfile das viaturas e dos tanques. Pessoalmente, foi um pouco antes disso. Então, já há algum tempo que não sentamos à mesa para tratar dos problemas do país. Acho até que isso precisa acontecer mais rapidamente.

O GLOBO: O senhor teme que as manifestações de 7 de setembro saiam do controle?

RP: Manifestações são próprias da democracia. Temos que respeitá-las, mas manifestações que tenham como objetivo retroceder a democracia, pretender intervenção militar ou a ruptura institucional ferindo a Constituição devem ser repelidas no campo das ideias.

O GLOBO: Como vê a mobilização de PMs em torno das manifestações pró-Bolsonaro?

RP: Se eu disser que conheço todas as Polícias Militares, vou estar mentindo, mas conheço algumas, em especial a de Minas Gerais e a de São Paulo. Sei que são corporações absolutamente conscientes, muito respeitadas pela sociedade, cumpridoras dos seus deveres e defensoras da democracia.

O GLOBO: Há algum risco de ruptura institucional por parte de militares? Qual é a sua percepção dos encontros que teve com integrantes das Forças Armadas?

RP: São instituições maduras, com um patriotismo muito forte e com obediência absoluta ao estado democrático de direito. Nesta semana, estarei no comando da Aeronáutica novamente para conversar com os brigadeiros, a convite do Alto Comando da Aeronáutica. Tenho mantido esse contato constante com essas instituições e vejo nelas uma obrigação de defesa do Brasil. Nós não admitiremos qualquer retrocesso e tenho certeza que também esse será o papel das Forças Armadas.

O GLOBO: A participação do presidente em um desfile de blindados em frente à Praça dos Três Poderes não gera ruídos?

RP: São episódios desnecessários, que deveriam ser evitados, especialmente neste momento em que há esses rumores. Mas não faço deles algo mais importante do que verdadeiramente são. O que vale é que temos as Forças Armadas conscientes do seu papel e muito bem comandadas por pessoas que têm esse compromisso com o país e que não se aventurarão em disputas ideológica e política.

GLOBO: Os ataques constantes do presidente ao sistema eleitoral podem colocar as eleições em 2022 sob algum risco?

RP: Os ataques ao sistema eleitoral, sem fundamentos, são muito ruins, porque jogam em descrédito um sistema que, até pouco tempo atrás, era dado por nós como um orgulho nacional. Mas não considero que isso seja capaz de deslegitimar o resultado eleitoral. As eleições de 2022 vão acontecer, porque elas são fundamentais para a democracia.

O GLOBO: Quais são as pautas prioritárias no Senado até o fim deste ano?

RP: Todas são prioritárias. Nesta próxima segunda-feira, terei uma reunião com o ministro Paulo Guedes. Quero fazer uma conversa de compreensão sobre o que são as prioridades do governo como alguém que possa ser colaborativo e, ao mesmo tempo, crítico daquilo que não se deva ter. Por exemplo, eu não posso permitir que haja, a pretexto de uma reforma tributária, um projeto que pura e simplesmente aumente impostos para o contribuinte. Isso é muito ruim. Devemos evitar isso. 

Na próxima semana, terei uma conversa com o ministro Bento Albuquerque, de Minas e Energia, sobre um problema gravíssimo que nós temos: precisamos de um planejamento para as crises hídrica e energética. O que nós não podemos definitivamente fazer é interromper o diálogo. Se isso ocorrer, vai ser muito nocivo para o Brasil.

O GLOBO: Como avalia a retomada das coligações partidárias nas eleições proporcionais, aprovada pela Câmara?

RP: Sou a favor do sistema proporcional sem coligações partidárias e com imposição da cláusula de desempenho. Vamos submeter ao Senado para que a maioria decida, mas a volta ao modelo anterior é um retrocesso.

O GLOBO: O senhor defende que o senador Davi Alcolumbre (DEM-AP) paute a sabatina de André Mendonça, ex-chefe da AGU, para o STF?

RP: É importante que o Senado dê uma resposta e que haja sabatina, a submissão do nome ao plenário do Senado para o escrutínio dos senadores. Não só no caso do ex-ministro André Mendonça mas também em todas as demais indicações.

O GLOBO: Como o senhor vê a iniciativa do governo Bolsonaro de turbinar o Bolsa Família?

RP: O programa social é uma prioridade. É inegável que ele tem que existir, em razão da pobreza que temos. Ressinto a falta de um Ministério do Planejamento independente da Economia, para termos um planejamento nacional de políticas dos ministérios, políticas públicas. Política econômica é algo muito amplo, que deve ser feito por especialistas, mas que não possam ser despidas de sensibilidade social.

O GLOBO: As pesquisas apontam uma polarização entre Bolsonaro e o ex-presidente Lula. É possível emergir desse cenário um candidato de centro?

RP: Várias hipóteses podem acontecer, mas considero que vai depender muito do andamento do Brasil nos próximos meses. O cenário eleitoral vai ser definido em 2022. Neste momento, o Brasil não precisa de candidatos à Presidência. O Brasil precisa do presidente buscando unificar o país para os problemas imediatos que nós temos.

O GLOBO: O senhor se vê como potencial candidato do centro?

RP: Não considero essa hipótese de candidatura neste instante em que se recomenda ter um presidente do Senado que possa enfrentar os problemas. Disputa eleitoral é inoportuna no momento, em especial para o presidente do Senado.

O GLOBO: O senhor dizia ser contra a abertura da CPI da Covid. Agora, avalia que a comissão tem desempenhado um papel importante?

RP: Temos que avaliar o retrato do momento em que decidi não abrir a CPI. Naquele momento, tínhamos mais de 4.000 mil brasileiros morrendo todos os dias só pela Covid-19. Era um momento muito crítico, de muita desunião. Não tínhamos uma escala de vacinas. Eu achava que a CPI, naquele momento, poderia ser um fator de desagregação maior e de insegurança jurídica para a estabilização do combate à doença. Mas eu não nunca desvalorizei a CPI e o seu papel. Nem nunca disse que ela não seria aberta. Eu apenas discuti o momento da abertura. A minha esperança é que a CPI possa cumprir o seu papel de apurar responsabilidades, autoria, materialidade, tipicidade de fatos e que aqueles que tenham praticado qualquer tipo de ação antijurídica possam ser responsabilizados.

O GLOBO: O presidente da Câmara criticou o andamento de algumas pautas no Senado como a privatização dos Correios e o licenciamento ambiental. O senhor acredita que Arthur Lira espera que o Senado passe a aceitar decisões da Câmara, sem alterações?

RP: Eu não recebo essa ponderação do presidente Arthur Lira como uma crítica ao Senado, mas apenas como um exercício de pretensão de que aquilo que foi aprovado na Câmara também o seja no Senado Federal. Nós também temos um uma porção de projetos aprovados no Senado que, ao longo de anos, estão na Câmara aguardando uma definição. Nem por isso eu digo que a Câmara está deixando de cumprir o seu papel. 

O que temos no Senado é a preocupação de aprofundar as matérias, de não ter açodamento, de termos a reflexão necessária por meio das comissões e do plenário. Cada um tem o seu perfil. Eu tenho um aspecto mais moderado. Não significa que eu seja lento. Mas eu gosto de refletir, de aprofundar, de submeter aos pares uma discussão realmente mais duradoura dos projetos de lei. Cada um tem o seu perfil e ambos se complementam e prestam um bom papel de unificação no Congresso Nacional.