segunda-feira, novembro 20, 2017

Velho templo do futebol santareno virou um matagal

Jota Parente - Decidi escrever esta crônica, depois de ler uma matéria no jornal O Impacto, assinada pelo confrade Jefferson Miranda. É sobre o estádio Elinaldo Barbosa dos Santos, que eu também considerava como um verdadeiro templo do futebol santareno. Até pouco mais da metade da década de 1980, era aquele local que aconteciam as grandes pelejas entre os clubes da Pérola do Tapajós e, principalmente, os memoráveis confrontos entre São Raimundo e São Francisco, o tradicional clássico Rai x Fran.
Quase centenário, a hoje abandonada praça de esportes foi inaugurada no dia 12 de dezembro de 1926 sob a denominação de Parque São Francisco, nome dado, não por causa do São Francisco Futebol Clube, que só viria a ser fundado dez meses depois, em 1927, mas, ao colégio São Francisco, dos padres franciscanos. Era o mais moderno de toda a região na época.
Mais tarde foi denominado Aderbal Caetano Correa, nome de um político da época, que foi prefeito da cidade, que perdurou até o final da década de 1960, quando em 15 de fevereiro de 1969, o então prefeito Elinaldo Barbosa foi assassinado em seu gabinete, pelo servidor público Severino Frazão. Era um sábado, dia em que prefeito nenhum costuma passar na prefeitura, mas, Elinaldo estava lá. Horas depois Frazão foi morto pelo sargento PM Raimundo Hércules, próximo do local do crime.
Elinaldo Barbosa, torcedor do São Raimundo, era um grande desportista, tendo sido presidente da Liga Esportiva de Santarém, onde desenvolveu um bom trabalho. Depois de sua morte, a Câmara Municipal decidiu homenageá-lo colocando seu nome no estádio.
Pois é, o velho estádio está caindo pelas tabelas e hoje é apenas saudade para quem tinha no futebol nas tardes de domingo o seu único entretenimento, até que chegasse outros, como a TV. Por lá desfilaram craques que eu vi jogar, tanto apenas como torcedor do Pantera, na minha infância e na adolescência, e por muitos e muitos anos, como cronista esportivo, tanto pela Rádio Rural, quanto pela Rádio Tropical.
Tive o privilégio de ver nascer para o futebol o jogador santareno que chegou mais longe, Manuel Maria, no meu São Raimundo, que depois de ser visto jogando pela Tuna, foi convocado para a Seleção Olímpica do Brasil, da qual diversos jogadores vingaram, foi contratado pelo Santos, onde na Vila Belmiro teve o privilégio de jogar ao lado de Pelé, do qual é amigo até hoje.
Vi Amiraldo, Abdala, Atauhalpa, Cristóvão Sena, Manoel Moraes, Licurgo, Bosco, Petróleo, Pão Doce, Acari, Zuza, Afonso, Arinos, Ricardo, Inacinho, Bigurrilho, Pedro Olaia, Mazinho, Pedro Nazaré, Jeremias, Cabecinha, Navarrinho, Becão, Figueroa, Renato, Belterra, Zé Lima, Edvar, Surdão, Xabregas, Alaércio, Odilson, Darinta, Birimba, Aleixo, Zizinho, Zerino, Surdão, Dão e tanta gente boa de bola mostrar sua classe naquele quadrilátero no qual o capim rasteiro crescia no inverno, porque não havia grama, e no verão algumas touceiras resistiam, misturando-se com pedras miúdas naquele terreno arenoso.
Bem no começo dos anos 1970, Clementino Santana Lima, o Quelé, então presidente da Liga Esportiva, teve a coragem de fazer um trabalho muito difícil para a época, que foi gramar o estádio, colocando no terreno, centenas de carradas de terra preta. Melhorou muito para os atletas.
Vi o Flamengo de Zico e Renato Gaúcho, vi o Botafogo de Marinho Chagas. Vi, até Mané Garrincha, com mais de quarenta anos fazer uma apresentação, levantando a torcida quando quase jogou o lateral esquerdo Ferreira, do São Raimundo, no alambrado, com o seu tradicional e manjado drible no qual ele fazia que ia para um lado e ia para o outro. Todos sabiam o que ele iria fazer, mas, nem os melhores laterais esquerdos do mundo conseguiram fugir do drible humilhante, que levava torcidas do mundo inteiro ao delírio.

Pois é, essa relíquia viva da história do futebol da região é hoje um matagal em pleno centro da cidade de Santarém, entre as avenidas São Sebastião e Rui Barbosa. Foi comprado pelo Grupo Yamada com o objetivo de virar um shopping, mas, o grupo teve sérios problemas financeiros, fechando diversas lojas, inclusive a de Santarém, e não se sabe que destino vai ser dado ao imóvel, que quando houve oportunidade, poderia ter sido desapropriado pelo poder público municipal, pois até hoje, se tivesse passado por uma boa reforma, poderia continuar sendo o memorável templo do futebol santareno, por muitos e muitos anos, mesmo com a existência do Barbalhão, por ter o seu custo operacional muito menor para a Liga e para os clubes. Ficaram apenas as boas lembranças para os mais velhos como eu.

*Artigo da edição 235 do Jornal do Comércio, circulando

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