Jota Parente - O veto da presidente Dilma Rousseff ao Projeto de Lei
416/2008 pegou o mundo político e as lideranças dos distritos que aguardavam a
sanção do mesmo para que se transformasse em lei. Com o veto, esmaeceu por
enquanto o sonho de das dezenas de distritos espalhados por todo o Brasil de se
transformar em novos municípios em pouco tempo.
Lamento que tenha sido essa decisão da presidente, porque
existem casos e casos. Há muitos distritos que almejavam se emancipar, mas, não
atendiam às exigências que o projeto de lei vetado fazia, e existem os que
sobravam, como nos casos de Moraes Almeida, em Itaituba, e Castelo dos Sonhos,
em Altamira. Sobretudo o segundo.
Passei por Moraes, Castelo e Cachoeira da Serra há pouco
mais de um mês, ocasião em que mantive contato com lideranças que trabalham
pela emancipação. O que vi foram comunidades organizadas que tem vida própria
em muitos aspectos, mas, que em diversos pontos continuam, e continuarão
dependendo da prefeitura de seus respectivos municípios, como na questão da
educação e saúde, citando somente dois pontos.
O veto da presidente foi baseado em parecer técnico do
Ministério da Fazenda, o que no meu ponto de vista torna a derrubada do mesmo
mais difícil, porque eu não acredito que a base aliada de Dilma vá querer
peitá-la neste momento de pré-campanha eleitoral. Para fazer isso, no meu
entendimento, o Congresso precisará apresentar para o governo e para a
sociedade uma justificativa mais forte e mais convincente do que a do
Ministério da Fazenda, o que não parece tarefa fácil.
Para o governo, a criação de pelo menos 188 novos
municípios no Brasil, como estava previsto inicialmente acarretaria em um
aumento das despesas do erário da União com a manutenção de sua estrutura
administrativa e representativas. Além disso, esse crescimento de despesas não
seria acompanhado por receitas equivalentes, o que impactaria negativamente a
sustentabilidade fiscal e a estabilidade macroeconômica. Por fim, segundo o
Planalto, haveria maior pulverização na repartição dos recursos do Fundo de
Participação dos Municípios - FPM, o que prejudicaria principalmente os
municípios menores e com maiores dificuldades financeiras", diz o despacho
assinado pela presidente.
A maioria dos novos municípios seria criada nos
Estados do Pará, Maranhão e Ceará. Certamente, se a maioria fosse de estados do
Sul e do Sudeste, em vez do Norte e do Nordeste, a situação tenderia a ser bem
diferente, porque a força política dos estados que compõem as duas regiões é
muito maior do que a nossa.
Em 1996, uma emenda
constitucional brecou o processo de multiplicação de novas municipalidades ao
exigir que uma lei regulamentasse critérios mínimos para que cidades se
desmembrassem de outras, constituindo uma administração própria. Depois de 17
anos de debates difíceis, foi aprovada no dia 16 de outubro no Senado a tal da
regulamentação que Dilma vetou.
Esse é um assunto complexo, pois, se por um lado cada novo município significa a
constituição de uma nova unidade política, com impactos na geografia do
controle político-territorial, e a maior parte dos municípios brasileiros
(novos, velhos, a serem criados etc.) tem baixíssima autonomia e capacidade de
gestão; do lado dos municípios que “perdem” territórios isso significa quase
sempre perder recursos, já que a maior fonte de receita é o fundo de
participação dos municípios, que é proporcional à população.
Porém, esse é só um lado da questão: em áreas do país
antes pouco povoadas, onde hoje se está intensificando a ocupação, a presença
de estruturas administrativas é raridade no território. Em alguns municípios da
região amazônica, por exemplo, a população pode levar dias dentro em um barco
para chegar à sede administrativa e ter acesso a determinados serviços
públicos, ou voar mais de 650 km, como é o caso de Castelo dos Sonhos e
Cachoeira da Serra, até chegar à sede do município, ou 1.000 km por estrada.
Também não se pode esquecer da distância de Moraes para Itaituba, que é de 300
km, por estrada difícil de trafegar no inverno.
Na verdade, um dos problemas do federalismo brasileiro é
que um município como Altamira (PA), com população espalhada em um território
do tamanho da Bélgica, tem as mesmas competências e atribuições de São Paulo,
com seus quase 12 milhões de habitantes… Ou de Borá (SP), com menos de 1000
moradores… Ou seja, chamamos de município realidades
sócio-econômico-territoriais muito distintas.
O fato é que a realidade
econômica, ambiental, urbana etc., do nosso país é regional, não é municipal. E
não temos estruturas de gestão territorial regionais.
O problema é que nosso sistema federativo subdesenvolvido
prevê apenas uma única categoria de município, além dos estados e da União. Uma
pequena cidade amazônica ou uma metrópole, tanto faz. Ou é tudo, ou é nada.
Podíamos ter unidades administrativas menores, mas com diferentes estruturas,
atribuições e competências, como acontece, por exemplo, nos Estados Unidos,
onde em muitos estados os condados tem subdivisões para descentralizar o poder
e melhor a qualidade dos serviços. Do mesmo modo, carecemos de estruturas
regionais.
Com esse veto a presidente Dilma matou o doente pensando
em curar a doença, porque muitos lugares que estão em condições de gerir seus
próprios destinos foram prejudicados pela decisão da presidente da República.
Eu, que sou adepto da emancipação, seja de distritos que estejam em condições
de pleitear o desmembramento do município mãe, assim como de regiões que
desejam se emancipar, como é o caso do Tapajós, lamento essa decisão.
Continuamos tão anacrônicos como antes em matéria de descentralização.
Na edição 170 do Jornal do Comércio, que está circulando
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