O primeiro dia da expedição começou perfeito. Acordei na
hora determinada, 04h30min da manhã, e depois de tomar um poderoso mingau
preparado por minha esposa Marilene, segui para a balsa para fazer a travessia.
Pouco depois, chegaram o repórter Mauro Torres e o cinegrafista Dionei Alves,
da TV Tapajoara, que fizerem uma matéria a respeito de minha largada, com tudo
tinha direito.
Tudo levava a crer que seria um dia maravilhoso. Mas, a
perfeição ficou somente naquele começo, pois ao passar pela ponte do km 17,
recebi a indesejada visita da chuva. E que chuva. Aí complicou, porque embora a
capa estivesse fácil de pegar, naquela situação, completamente escuro, não
houve como colocar a proteção contra chuva.
Então,
decidi ir em frente, contudo, com muita dificuldade, pois mal enxergava a
estrada, conquanto a chuva era torrencial. Corri o risco de sair da estrada,
uma vez que estava em um local da BR 230 que não tem sinalização
horizontal. E como diz o ditado, nada é
tão ruim que não possa piorar, chegou a parte da estrada onde ainda não existe
pavimentação asfáltica. Foi muito difícil superar aquela situação.
Quando
cheguei ao distrito de Campo Verde, apenas chuviscava, o que me levou a pensar:
já estou molhado, mesmo! Nesse caso, o melhor que tenho a fazer seria seguir em
frente. E foi o que fiz. Para meu azar, pouco depois de entrar na
Santarém-Cuiabá a chuva voltou com força total. Mas, mesmo com todo o aguaceiro
que caía, eu levei apenas uma hora e meio para chegar à cidade de Trairão.
Conversei
com algumas pessoas que se encontravam no Auto Posto Leal, onde completei o
tanque. Dentre essas pessoas havia dois motoqueiros que conhecem muito bem
aquela área, os quais me avisaram que tinha chovido em toda a região.
Adiantaram-me que, dada a intensidade da chuva eu iria enfrentar muitos
problemas, citando até os pontos mais críticos.
Não
deu outra! Conforme me foi dito, a coisa ficou preta a partir do momento em que
acabou o asfalto, uns vinte km depois de Trairão. E exatamente como me disseram
os dois rapazes, até o distrito de Caracol eu consegui levar a moto com
relativa tranquilidade, pois a estrada de chão estava bem compactada e ninguém
mexeu, diferente do que aconteceu depois, onde estão trabalhando, ou
trabalharam.
Eu
pensei que o distrito de Caracol iria ficar marcado em minha mente, porque foi
depois de lá que levei o primeiro tombo. Tem uma serra das boas, que fica uma
beleza quando chove. Para meu azar, já havia passado por ali um bom número de
carretas, que prepararam o terreno para quem viesse depois. E olha que eu
estava indo bem, mas, fica tão liso, que é impossível segurar a moto. Caí em primeira
marcha, o que significa dizer que eu estava quase parado. Não estava longe de
algumas carretas, mas, foi um senhor que estava em uma Hilux quem me ajudou a
levantar a moto. Ela afogou, apesar de ter fechado a válvula da gasolina. Por
isso, deu muito trabalho para pegar novamente.
Apesar
da enorme dificuldade, fui em frente, devagar, quase parando, pois não havia como
avançar com um mínimo de rapidez naquelas circunstâncias. Todavia, quando
estava distante algo como cinco km da comunidade Três Bueiras o sofrimento
aumentou. De novo, ia em primeira marcha, quando cheguei a um local cujo barro
parecia ter sido feito com algum ingrediente do sabão, pois a mal conseguia
manter-se de pé.
Não
deu para segurar a moto, de novo. E quando tentei me equilibrar com apoio dos
pés, quem foi que disse que conseguiu um mínimo de aderência! Estatelei-me no
chão, novamente, por três vezes, e como da vez anterior, em primeira marcha.
Dessa vez, um solícito trabalhador do consórcio que trabalha na pavimentação
naquele trecho veio correndo me ajudar. Mais uma vez a moto demorou a pegar
porque afogou.
Faltavam
mais ou menos dois km para chegar à bendita Três Bueiras quando eu beijei o
chão pela terceira vez. Foi nessa queda que me ralei na perna esquerda. E de
tanta força que fiz para tentar evitar a queda, a moto ficou virada no sentido
contrário ao que eu viajava. Por isso, quando um senhor de uma D 20foi me
ajudar, disse que eu ainda iria enfrentar muita lama até Trairão, quando lhe
informei que estava indo rumo a Novo Progresso.
Alguém
havia me informara muitos quilômetros atrás, que o problema era somente até a
comunidade citada, pois a partir dali a estrada estava boa, porque o trecho
tinha piçarra. Logo, passei a sonhar com a tal Três Bueiras, que para mim
passou a ser a terra prometida.
Mais
ou menos um quilômetro e meio depois da terceira queda eu parei ao lado de umas
carretas, porque não estava me sentindo bem. Sem comer desde 04h30min, a
glicemia baixou muito. Faltavam dez minutos para uma tarde, e eu estava apenas
com o mingau da madrugada, eu mal consegui puxar o descanso da moto.
Estou
passando mal, disse para um dos carreteiros. Rapidamente ele levantou a
cadeirinha em que estava sentado, para que eu me acomodasse nela. Apareceram
mais alguns colegas dele, que foram muito legais. Um deles perguntou se eu
queria tomar um copa de água com açúcar, ao que respondi que sim. Ele preparou,
tomei e ingeri mais alguns copos de água, além de comer alguns pedaços de
abacaxi. Pelo menos uns quatro deles foram perguntar se eu não gostaria de
almoçar junto com eles. Respondi que não, pois de fato não estava com fome.
Havia passado muito a hora de almoçar.
Aconteceu
que além de ter passado da hora de me alimentar, porque não havia nem como
parar em algum lugar para comer, eu havia feito um esforço muito além dos meus
limites, tanto para levantar a moto quando eu caí, como pela briga que eu
travei para evitar que a moto me derrubasse mais vezes. Por essa razão, quando
cheguei até os caminhoneiros, estava completamente exausto, sem forças e
passando mal.Sinceramente, pensei que iria desmaiar.
Fiquei
ali por trinta minutos, até sentir que já tinha condições de voltar a pilotar.
E lá fui eu em busca de Três Bueiras e a estrada da libertação. Isso já era uma
e meia da tarde. Ora, quem tinha saído de Trairão às 07h30min, seis horas
depois havia progredido muito pouco. Com extremo cuidado para evitar mais um
tombo, consegui chegar ao bendito local onde a estrada melhorava. A partir dali
as coisas começaram a mudar para melhor, até Moraes Almeida. Mas, Três Bueiras
ficou gravada na minha mente e passa a fazer parte da minha história.
Parei
em Moraes para fazer uma entrevista com o presidente do Conselho Pela
Emancipação do local, Ubiratan Filadelpho. Foi uma conversa de pouco mais de
meia hora, depois da qual parti para Novo Progresso, para ganhar terreno,
porque existe um trecho de 57 km de Moraes para essa cidade, e eu não queria
correr o risco de ter que voltar a brigar com a moto, caso chovesse à noite.
Entrando
em Novo Progresso enfrentei meu primeiro perigo realmente sério no trânsito,
por absoluta culpa minha. Cansado, no corpo e na mente, fiz uma manobra errada
na frente de um caminhão grande, que por pouco não me atingiu. O motorista
acionou a buzina, com raiva, e com razão.
Cheguei ao meu destino pouco depois das sete da
noite, indo direto para o Hotel Rodoviário, cujo proprietário é o Seu Mané.
Aproveitamos para passar uma borracha em algumas mágoas que ficaram dos tempos
em que fui diretor da Rádio Itaituba, quando ele era o proprietário. Confesso
que isso me fez muito bem, e imagino que a ele também, pois ressentimentos não
fazem bem para a saúde. Conversamos por mais de duas horas, relembrando os bons
tempos da rádio, que hoje se chama Rádio Tapajoara. Na próxima edição contarei
mais detalhes da jornada.
* Na edição 169 do Jornal do
Comércio, que está circulando
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