quinta-feira, maio 16, 2013

Só prender não resolve o problema da violência - parte 2


             Marilene Parente - Dando prosseguimento ao artigo da edição anterior do Jornal do Comércio com o título só prender não resolve o problema da violência, pegando o gancho do final do artigo, começo pela questão da redução da maioridade penal, assunto que nunca sai de pauta, sobretudo quando algum menor comete crime bárbaro, coisa que, lamentavelmente, acontece com certa frequência em nosso País.
            Quando afirmo que no meu entendimento, não basta prender, e nesse caso, prender menor de idade, só mudando a lei, a primeira reação de alguns setores da sociedade sempre que um adolescente comete um crime grave é gritar pela redução da maioridade penal. Ou quase isso: dificilmente vemos a mesma reação quando a vítima mora na periferia (nesses casos, a notícia vira apenas uma notinha nas páginas policiais). Mas vamos evitar leituras ideológicas do problema.
            A redução da maioridade penal não resolve nem ameniza o problema da violência. “Toda a teoria científica está a demonstrar que ela [a redução] não representa benefícios em termos de segurança para a população”, afirmou em fevereiro Marcos Vinícius Furtado, presidente da OAB. A discussão em torno na maioridade penal só desvia o foco das verdadeiras causas da violência.
            O Instituto Não Violência é bem enfático quanto a isso: “As pesquisas realizadas nas áreas social e educacional apontam que no Brasil a violência está profundamente ligada a questões como: desigualdade social (diferente de pobreza!), exclusão social, impunidade (as leis existentes não são cumpridas, independentemente de serem “leves” ou “pesadas”),falhas na educação familiar e/ou escolar principalmente no que diz respeito à chamada educação em valores ou comportamento ético, e, finalmente, certos processos culturais exacerbados em nossa sociedade como individualismo, consumismo e cultura do prazer.
                Para citar apenas um exemplo de que somente tirar a liberdade não resolve o problema da violência como um todo e, em especial, no caso de menores infratores, vale aqui lembrar a falência da Fundação Casa, de São Paulo, o mais rico estado da União, que em vez de recuperar os jovens, acaba incentivando os internos a subir os degraus do crime. Nos demais estados não deve ser muito diferente.
            Um pedagogo que trabalha lá, cujo nome não foi revelado num depoimento que ele deu à revista Fórum, com medo de sofrer represálias, disse que sofreu ameaças frequentes por contestar os atos abusivos da direção. Ele afirmou que a Fundação Casa nasceu para dar errado. Os menores saem de lá com mais ódio, achando que as pessoas são todas ruins e que não há como mudar isso. São desrespeitados como seres humanos, são tratados como lixo. E isso faz com que eles pensem que não podem mudar.”
            Atuante na Fundação há onze anos, o pedagogo conta que os atos de violência contra os adolescentes são cotidianos e descarados, apoiados inclusive pelo diretor, que também “bate na cara dos meninos”. Essa bola de neve de violência só poderia resultar em crimes cada vez mais graves cometidos pelos menores.
            A inclusão de adolescentes infratores nesse sistema não só tornaria mais caótico o sistema carcerário como tende a aumentar o número de reincidentes. A medida pode tornar os jovens criminosos ainda mais perigosos: Colocar menores infratores numa prisão comum será uma forma de aumentar o número de criminosos reincidentes, com prejuízo para a sociedade. Esse tema de redução da maioridade penal exige uma discussão muito mais aprofundada.
            Se prender, indiscriminadamente, resolvesse o problema da violência, os Estados Unidos da América do Norte tinham tudo para ser um mar de tranquilidade. Porém, a Unicef destaca os problemas que os EUA enfrentam por colocar adolescentes e adultos nos mesmos presídios. Conforme publicado este ano nos idos de 2007 no jornal The New York Times, a experiência de aplicação das penas previstas para adultos para adolescentes nos Estados Unidos foi mal sucedida resultando em agravamento da violência. Foi demonstrado que os adolescentes que cumpriram penas em penitenciárias, voltaram a delinquir e de forma ainda mais violenta, inclusive se comparados com aqueles que foram submetidos à Justiça Especial da Infância e Juventude daquele país.
            Por tudo que foi dito, na minha compreensão, é preciso que a sociedade brasileira desperte da letargia que permite que a violência grasse neste país; violência praticada por menores, violência que parte dos criminosos maior de idade, violência da superlotação dos sistema prisional, o que o transforma em verdadeira escola do crime, violência existente nas chamadas casas de recuperação, e um tipo de violência que nos afeta no dia a dia: a corrupção praticada por agentes públicos, com ou sem mandato eletivo. Esse tipo de violência, cujo combate se dá de forma lenta pelo Judiciário, contribuindo para a impunidade, tira comida da boca de crianças pobres, impede o funcionamento de muito mais creches e escolas, além de prejudicar o bom funcionamento dos sistemas de educação e de saúde do país. É por isso que eu entendo que só prender, prender e prender não resolve o problema da violência no Brasil.
            Marilene Parente é bacharel em Direito

Artigo publicado na edição 159 do Jornal do Comércio, que está circulando

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