O problema do
mau uso do gerúndio, essa praga que incomoda quem gosta do bom Português, está
muito presente, também, em Itaituba. Por isso, o Jornal do Comércio decidiu
publicar o artigo a seguir, como forma de contribuir para combater esse modo
equivocado de falar nossa língua, inclusive nesta cidade, onde gente graúda, usa
e abusam desse expediente.
Ricardo Freire - Este artigo foi feito especialmente
para que você possa estar recortando e possa estar deixando discretamente sobre
a mesa de alguém que não consiga estar falando sem estar espalhando essa praga
terrível da comunicação moderna, o gerundismo. Você
pode
também estar passando por fax, estar mandando pelo correio ou estar enviando
pela internet.
O importante é estar garantindo que
a pessoa em questão vá estar recebendo esta mensagem, de modo que ela possa
estar lendo e, quem sabe, consiga até mesmo estar se dando conta da maneira
como tudo o que ela costuma estar falando deve estar soando nos ouvidos de quem
precisa estar escutando.
Sinta-se livre para estar fazendo
tantas cópias quantas você vá estar achando necessárias, de modo a estar
atingindo o maior número de pessoas infectadas por esta epidemia de transmissão
oral.
Mais do que estar repreendendo ou
estar caçoando, o objetivo deste movimento é estar fazendo com que esteja
caindo a ficha das pessoas que costumam estar falando desse jeito sem estar
percebendo. Nós temos que estar nos unindo para estar mostrando a nossos
interlocutores que, sim, pode estar existindo uma maneira de estar aprendendo a
estar parando de estar falando desse jeito. Até porque, caso contrário, todos
nós vamos estar sendo obrigados a estar emigrando para algum lugar onde não vão
estar nos obrigando a estar ouvindo frases assim o dia inteirinho.
Sinceramente: nossa paciência está
ficando a ponto de estar estourando.
O
próximo "Eu vou estar transferindo a sua ligação" que eu vá estar
ouvindo pode estar provocando alguma reação violenta da minha parte. Eu não vou
estar me responsabilizando pelos meus atos. As pessoas precisam estar entendendo
a maneira como esse vício maldito conseguiu estar entrando na linguagem do dia
a dia.
Tudo
começou a estar acontecendo quando alguém precisou estar traduzindo manuais de
atendimento por telemarketing. Daí a estar pensando que "We'll be sending
it tomorrow" possa estar tendo o mesmo significado que "Nós vamos
estar mandando
isso
amanhã" acabou por estar sendo só um passo.
Pouco a pouco a coisa deixou de
estar acontecendo apenas no âmbito dos atendentes de telemarketing para estar
ganhando os escritórios. Todo mundo passou a estar marcando reuniões, a estar
considerando pedidos e a estar retornando ligações. A
gravidade
da situação só começou a estar se evidenciando quando o diálogo mais coloquial
demonstrou estar sendo invadido inapelavelmente pelo gerundismo.
A primeira pessoa que inventou de
estar falando "Eu vou tá pensando no seu caso" sem querer acabou por
estar escancarando uma porta para essa infelicidade linguística estar se
instalando nas ruas e estar entrando em nossas vidas. Você certamente já deve
ter estado estando a estar ouvindo coisas como "O que cê vai tá fazendo
domingo?" ou "Quando que cê vai tá viajando pra praia?", ou
"Me espera, que eu vou tá te ligando assim que eu chegar em casa".
Deus, o que a gente pode tá fazendo
pra que as pessoas tejam entendendo o que esse negócio pode tá provocando no
cérebro das novas gerações? A única solução vai estar sendo submeter o
gerundismo à mesma campanha de desmoralização à qual precisaram estar sendo expostos
seus coleguinhas contagiosos, como o "a nível de", o
"enquanto", o "pra se ter uma idéia" e outros menos
votados. A nível de linguagem, enquanto pessoa, o que você acha de tá
insistindo em tá falando desse jeito?
P.S. Sinta-se livre para estar
fazendo tantas cópias quantas você vá estar achando necessárias, de modo a
estar atingindo o maior número de pessoas infectadas por esta epidemia de
transmissão oral.
Ricardo
Freire, escritor, publicitário e jornalista especializado em turismo - Texto
originalmente publicado na coluna Xongas, no Jornal da Tarde, em 16 de
fevereiro de 2001 e posteriormente incluído no livro As cem melhores crônicas
brasileiras.
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