Fordlândia foi parar no Marajó; o cabano Angelim virou Alecrim e os restos mortais de Dom Pedro I não foram desembarcados no Recife, rs
Por MDutra
Com frequência ouço no Rádio, pronunciadas inclusive por alguns ex-alunos/as meus, expressões tais como “o Tribunal de Contas do Município de Belém”, “as ruas do município”, nomes como “Simon Bolivár”, termos como “terraplanagem”. Os exemplos são muitos, incluindo, nos impressos, a separação, com vírgula, entre o sujeito e o verbo.
Belém não tem tribunal de contas isoladamente, trata-se de Tribunal de Contas dos Municípios do Estado do Pará, logo, de todos os municípios. O outro é o Tribunal de Contas do Estado do Pará, que julga as contas do governo do Estado, isoladamente ou nos convênios com os municípios.
Quanto às “ruas do município” parece haver aí uma desinformação entre o ente Município e sede municipal. A sede do município obviamente é a cidade, onde há ruas, avenidas, travessas, becos, etc. As estradas situam-se no interior, a não ser nalgum caso raro.
Simón Bolívar, um dos maiores vultos da história latino-americana, não é Bolivár. E terraplanagem é, originalmente, terraplenagem, ação mecânica que tem a ver com o termo “pleno”=cheio, ou seja, é uma ação de enchimento de valas, etc. No entanto, de tanto se pronunciar diferente do original, alguns autores já admitem a “terraplanagem”, no sentido de tornar o terreno plano.
Porém, estes erros que cometemos no nosso dia a dia de jornalistas, por exemplo, são café pequeno diante de outros cometidos por exemplo, por pesquisadores ou historiadores. Três exemplos cabeludos que seguem:
O escritor ou historiador Antônio Espírito Santos publicou, em 1956, um livro intitulado “O Vale Amazônico no Futuro do Mundo”, que traz na capa a advertência de “2ª. edição revista e atualizada”. Seu autor o publicou pela segunda vez em São Paulo, na editora Edgfraf. Na página 176 ele afirma: “...Na Fordlândia já existe o plantio científico ... É perfeita organização americana, localizada em terras paraenses, na Ilha do Marajó”. Como se vê, o autor transportou Fordlândia do baixo rio Tapajós para a Ilha do Marajó, mesmo numa edição “revista e atualizada”. O erro se repete em outras páginas desse livro que encontrei no acervo do Instituto Cultural Boanerges Sena, em Santarém, por obra e graça de seu presidente, Cristóvam Sena.
Tempos atrás, vasculhando as prateleiras de uma livraria em Florianópolis, dei com uma obra intitulada “As raízes do separatismo no Brasil”. Além de cometer o deslize de afirmar, sem provas, que a Cabanagem foi um movimento separatista (hoje isso é negado pela pesquisa documental), o autor Manuel C. de Andrade informa ao seu leitor que um dos mais destacados líderes da Cabanagem, tendo presidido a província rebelde por quase um ano, chamava-se Eduardo Alecrim, em vez Angelim, como se tornou conhecido por esse apelido o jovem líder cabano.
Jornalista escreve com pressa. Mesmo quando envereda pela historiografia ou a pesquisa científica, carrega consigo os vícios das redações, das pautas que são elaboradas e horas depois devem estar cumpridas, textos e fotos prontas, etc. Não é essa a rotina de um historiador ou cientista, na busca de comprovar as suas hipóteses, catar documentos, etc.
Nos últimos anos jornalistas brasileiros vêm publicando livros frutos de pesquisa sobre fatos históricos, alguns deles best-sellers, como é a trilogia de Laurentino Gomes, jornalista de Maringá, Paraná. Refiro-me a seus três livros titulados numericamente, indicando os anos que marcam períodos da vida brasileira: 1808, 1822, 1889, que têm como epicentro narrativo justamente a fuga da família real para o Brasil, a Independência e a Proclamação da República.