quinta-feira, outubro 21, 2021

Populismo de Bolsonaro e Guedes deflagra crise e debandada na Economia

A exigência do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) de turbinar gastos em ano eleitoral e a manobra para driblar a regra constitucional do teto de gastos derrubaram a Bolsa, fizeram disparar dólar e juros e causaram uma debandada no time do ministro Paulo Guedes (Economia).

Quatro secretários da equipe econômica pediram demissão nesta quinta-feira (21) por discordarem das decisões. Pediram para deixar o governo dois dos principais nomes do núcleo da pasta, o que comanda as contas públicas.

O maior representante da área, abaixo de Guedes, é o secretário especial do Tesouro e Orçamento, Bruno Funchal. Ele e o secretário do Tesouro Nacional, Jeferson Bittencourt —subordinado a Funchal—, pediram exoneração dos cargos.

Em nota, o Ministério da Economia afirmou que também deixarão os cargos técnicos-chave da pasta. São eles a secretária especial adjunta do Tesouro e Orçamento, Gildenora Dantas, e o secretário-adjunto do Tesouro Nacional, Rafael Araujo.​

A debandada ocorreu após semanas de escalada da pressão do Palácio do Planalto sobre a equipe econômica por mais recursos, e horas após a formalização de uma proposta do governo para driblar o teto de gastos, regra que limita o crescimento das despesas públicas federais.

A medida abre margem de ao menos R$ 83 bilhões no Orçamento em ano eleitoral, inclusive para turbinar emendas parlamentares, recursos direcionados pelos deputados e senadores para bases eleitorais.

Alinhado à ala política do Palácio do Planalto e ao centrão, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) anunciou uma série de gastos às vésperas de ano eleitoral. Em 2022, ele buscará a reeleição.

O imbróglio está em torno de garantir R$ 400 para o Auxílio Brasil. O programa substituirá o Bolsa Família, uma marca do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que hoje lidera a corrida presidencial.

O Ministério da Economia atribuiu os pedidos de demissão dos quatro secretários a "razões de ordem pessoal".

Segundo a pasta, as solicitações foram feitas de modo a permitir que haja um processo de transição e de continuidade. Eles continuarão no cargo até a nomeação dos substitutos, cujos nomes não foram divulgados.

A Folha, no entanto, apurou que Funchal afirmou à sua equipe que deixa o governo por questão de princípios. O secretário demissionário já havia dito que não chancelaria medidas que subvertessem a ordem fiscal.

"Funchal e Bittencourt agradecem ao ministro pela oportunidade de terem contribuído para avanços institucionais importantes e para o processo de consolidação fiscal do país", disse o ministério.

A debandada é reflexo de uma crise aberta no governo entre a equipe econômica e a ala política. Cobrado pelo centrão e interessado em medidas com apelo eleitoral, Bolsonaro exigiu o pagamento de R$ 400 a beneficiários de programas sociais até o fim de 2022, ano de eleição.

Integrante do centrão, o líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), minimizou os pedidos de demissão. Ele elogiou o time de Guedes e disse que novos nomes estarão a serviço do governo.

"A equipe econômica, que vem bem conduzindo esta crise provocada pela pandemia, terá substituições por técnicos igualmente qualificados que continuarão prestando bons serviços. Guedes firme e forte como sempre na condução da economia", disse Barros, no Twitter.

O contorno às regras fiscais foi a saída encontrada pelo governo para viabilizar o Auxílio Brasil turbinado. Guedes era contra e tentou negociar uma solução sem alterações no teto, mas foi vencido na discussão com a ala política.

Segundo relataram membros do governo à Folha, quando Guedes apresentou a ideia à própria equipe, houve forte reação de subordinados e ameaças de demissão.

Pela falta de consenso e pela necessidade de mais tempo para a elaboração da proposta, o anúncio dos R$ 400 foi suspenso. O plano passou a ser adaptado com ajuda da própria equipe econômica e desencadeou a proposta alternativa, que expande o teto de gastos.

Nesta quinta, governo e aliados no Congresso inseriram na PEC (proposta de emenda à Constituição) que adia o pagamento de precatórios —dívidas reconhecidas pela Justiça— uma mudança na regra de correção do teto de gastos, para expandir o limite para as despesas.

O conjunto das alterações previstas cria um espaço orçamentário de R$ 83 bilhões no ano eleitoral de 2022, de acordo com o relator da proposta, deputado Hugo Motta (Republicanos-PB).

Antes mesmo do anúncio da saída dos secretários, o mercado havia encerrado o dia com reação negativa forte à proposta do governo.

A Bolsa fechou em queda de 2,75%. O dólar subiu 1,88%, a R$ 5,6670, e os juros futuros aumentaram os prêmios, com o DI para janeiro de 2025 em alta de quase 60 pontos-base, a 11,48% ao ano.

Fonte: Folha

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