quinta-feira, julho 04, 2019

Expedição ao Fim do Mundo, Parte IV: Chegando a Ushuaia

Chegando a Ushuaia

           Rio Gallegos é uma cidade um pouco menor que Itaituba. Seu nome deriva do nome do rio que a banha. Foi lá meu penúltimo pernoite antes de alcançar o objetivo final da ida, que era Ushuaia, que seria fácil, fácil de alcançar, pois, são somente 586 km de distância. Ainda estava bem baqueado pela queda sofrida fazia dois dias. Por isso, não tive condições de levantar cedo, como fazia sempre, porque estava com muitas dores no corpo e com os dois joelhos machucados, sobretudo o joelho direito. Só saí depois das nove da manhã. Mesmo assim, daria, não fossem os imprevistos.
            Percorridos 92 km, eu estava atravessando a fronteira da Argentina com o Chile e 122 km após deixar Rio Gallegos, estava do outro lado da travessia do Estreito de Magalhães, sentindo-me dentro da História, inserido nos livros de Geografia nos quais aprendi sobre aquele acidente geográfico ainda na adolescência. Tive que esperar pela embarcação que faz a travessia.
            Perdi um tempo considerável até conseguir atravessar, e mais uns bons minutos quando cheguei do outro lado, porque eu cometi uma barbeiragem na hora de sair do transporte no qual cruzei o estreito, tendo afogado minha moto novinha. E cadê forças para empurrar para tentar desafogar, porque naquele lugar era a única coisa que eu podia fazer. Mesmo assim, empurrei até quase cair de cansado.
Apareceu uma alma boa, um chileno, motorista de caminhão grande, que veio até mim perguntando se eu precisava de ajuda. Disse que sim, explicando qual era o problema. Forte como um touro, ele pegou a moto, empurrou umas quatro vezes e a fez pegar sem maiores dificuldades. Ufa, que alívio. Temi ficar parado naquele lugar deserto.
Na cidade, perto dos montes que a cercam
Quando chegue a Rio Grande, era pouco mais de cinco da tarde, longe de terminar o dia, uma vez que eu já estava quase 55 graus ao sul da linha do Equador. Naquela latitude, no período do verão, que é curto, o Sol se põe depois das dez da noite. Mas, eu estava sentindo os efeitos da queda de dois dias atrás. Por isso, o bom senso mandou que eu parasse.
De lá para Ushuaia seria um pulo. Não precisava sair cedo. Tomei café, esforçando-me para fazer a primeira refeição do dia com tranquilidade, porque o coração batia mais acelerado pela ansiedade de chegar ao objetivo. Faltavam apenas 310 km.
Na medida em que me aproximava, a Terra do Fogo reserva-me surpresas com vistas de calendário. Fiz muitas fotos, algumas delas belíssimas. Porém, a última surpresa foi uma serra com mais de 30 km de extensão já bem perto de Ushuaia, onde o relevo sofre influência do início da Cordilheira dos Andes. Tanto, que a cidade é carcada por montes cuja altitude varia entre 400 a 1.300 metros. Na parte mais baixa, a cidade tem uma altitude de apenas seis metros, todavia, com subidas íngremes em suas travessas, chega a mais de 100 metros rápido.
Passeei pela serra repleta de curvas com todos os ângulos, com muito cuidado, mas, divertindo-me muito, pois sempre gostei demais dessa parte das minhas aventuras de moto. Com muito cuidado, porque havia várias indicações de acidentes com vítimas fatais de pessoas que não jogaram direito o jogo, superei a serra. Certo dia, li na primeira viagem com o Jadir, em plena Cordilheira dos Andes, a mais de 3.000 metros, uma placa advertia: “la via es um juego”. Eu obedeci a regra do jogo, na ida e na volta.
Depois da serra, quanto mais eu descia me aproximando de Ushuaia, mais intenso era o frio, aliado ao vento que não dava tréguas. Às 16:20 HS, quando cheguei em frente ao pórtico da cidade, o termômetro marcava 13 graus centígrados. Eu saíra de Rio Grande com uma temperatura de 15 graus, tendo chegado à máxima de 17 depois de meio-dia, começando a despencar.
No caminho encontrei Guanacos, da família
das Llamas a toda hora. Era preciso ter cuidado
Entrei na cidade sem nenhuma pressa, apreciando cada detalhe de sua arquitetura e cada ponto das suas exuberantes belezas naturais. Fiquei imediatamente encantado e apaixonado por aquele cenário paradisíaco digno de qualquer filme romântico com final feliz. É único.
Alguns quilômetros depois de cruzar o Estreito de Magalhães, encontrei uns argentinos que estavam voltando de Ushuaia com os quais engatei uma conversa que me foi muito útil. Um deles me disse que tinha ficado no Hotel Lo Momo, que era muito legal, perto de tudo, no centro e com preço bom. Fui lá e gostei do local e do tratamento especial do Jerônimo Olmo, o Momo, dono.
Foram três dias maravilhosos nos quais pude desfrutar da boa acolhida que tive do povo daquela cidade hospitaleira, que vive cem por cento do turismo, sabe da importância disso, respeita os seus visitantes e deixa a gente com vontade de voltar.
Visitei tudo que era possível visitar tendo algumas surpresas como uma viagem à Antártida, sem sair de Ushuaia. É um pequeno museu que conta a história dos grandes exploradores, tanto os argentinos, quanto estrangeiros, que deixaram seu nome escrito na história. O maior de todos foi Roal Amundsen, norueguês que foi o primeiro homem a liderar uma expedição que chegou à Antártida. Para terminar, a tive a oportunidade de conhecer muito da Antártica em um filme de pequena duração por meio de uns óculos 3D, o que é uma emoção só.
 Apenas por curiosidade fui a um dos boxes que ficam na orla da baía de Ushuaia, que vendem excursões para pontos turísticos, que são vários. Viagens mais curtas ou mais longas para conhecer o habitat lobos marinhos, pinguins e outros bichos. Vendem, também, excursões para a Antártida. Fui saber do preço, que não me agradou muito. A excursão mais barata custava a bagatela de U$ 4.800,00 (quatro mil e oitocentos dólares). Tinha umas de quase U$ 20 mil. Era apenas curiosidade.
No Hotel Lo Momo pude conviver com diversos latinos e com um canadense de nome Paul. Foi uma ótima oportunidade que eu aproveitei bem para exercitar o Inglês e o Espanhol. A única coisa que realmente incomodou foi o frio que lá é sempre de lascar, mesmo para quem vive em regiões mais frias do que a nossa, como no sul do país, onde no inverno as temperaturas despencam. Em Ushuaia, nos três dia que fiquei na cidade, durante o dia o termômetro oscilou entre 10 e 13 graus. À noite, após meia-noite, cheguei a pegar -3 (três graus negativos). E haja edredom.
Completei, desse modo, a primeira parte de um projeto que para muitos era pura loucura de um homem de 68 anos de idade. Chegar à última cidade do hemisfério sul era um grande desafio a ser vencido, porque, algumas horas depois de sair de Buenos Aires rumo ao extremo meridional, as cidades passaram a ficar muito longe umas das outras. Nada podia dar errado. Felizmente, deu quase tudo certo, pois, um ou outro imprevisto faz parte. A partir da próxima edição começarei o relato da volta pra casa.

Matéria publicadoana edição 248 do Jornal do Comércio, que está circulando desde a manhã de hoje.

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