sexta-feira, setembro 28, 2018

América do Sul de Moto, Tintim por Tintim - Parte 7

Assinamos o livro de visitantes em La Casa de La Convención

Por volta de três horas da tarde do dia 22 de outubro chegamos a Rionegro, (é escrito assim mesmo) cidade do departamento de Antioquia, também conhecida como Cunha da Democracia, pois lá aconteceram algumas grandes batalhas no período em que a Colômbia lutava por sua independência, sob a liderança de José Maria de Córdoba, cujos restos mortais encontram-se lá. Em Rionegro, no ano de 1886 foi escrita a primeira constituição daquele país. Hoje em dia, no local onde esse fato histórico aconteceu funciona um museu histórico chamado de Casa de La Convención, onde eu e o Jadir estivemos.

Enquanto a equipe da autorizada Honda tentava recuperar a moto do Jadir, saímos para conhecer um pouco da cidade, que tem 101 mil habitantes, sendo mais ou menos do tamanho de Itaituba. Ficamos impressionados com o movimento do comércio local, que funcionava até as dez horas da noite. A qualidade de vida é muito boa. Mulheres muito bonitas, as mais bonitas que vimos até agora. Um povo que parece estar feliz o tempo todo. A economia gira, principalmente, em torno do cultivo de flores que são exportadas para os Estados Unidos, a maior parte, e para a Europa. Toda semana saem de Rionegro alguns aviões de carga abarrotados de flores.

A simpatia do povo colombiano se materializou algumas vezes. Ontem, 21 de outubro, ao abastecermos num posto de gasolina o frentista perguntou se a gente não estava precisando de pesos colombianos. Aquilo soou como música aos nossos ouvidos. 

Conseguimos adiar um pouco o nosso sofrimento. Tínhamos pressa para chegar a Bogotá para ver se lá a gente conseguia converter os nossos reais, que valiam tanto quanto papel de embrulho onde estávamos.

Ontem eu levei alguns sustos na Panamericana. Tentei ultrapassar uma carreta quando vinha outra em direção contrária, a qual me fechou. Por pouco não me dei muito mal. Outra situação complicada aconteceu porque estava chovendo e a gente desenvolvia uma boa velocidade. Numa curva um pouco fechada eu entrei mais rápido do que deveria. Apertei os freios traseiro e dianteiro e a moto derrapou um pouco na pista molhada. Soltei os freios, mas, a moto ainda estava numa velocidade um pouco alta para fazer a curva e de quebra vinha uma carreta em direção contrária à minha. Sinceramente, achei que não conseguiria desviar dela. Quando passei, respirei aliviado e maneirei um pouco na velocidade.

As nuvens estavam à altura de nossa cabeça
Ficamos por 25 horas em Rionegro, o que superou em muito a nossa expectativa de permanência naquela cidade. Isso não teria sido nada se a moto do amigo Jadir tivesse saído da concessionária funcionando direito. Mas, saiu do mesmo jeito, apesar de terem tentado calibrar válvulas e um monte de outras coisas que tentaram fazer. Eu já estava bastante impaciente e dava pressão para ver se os caras resolviam o problema.

Eram quatro da tarde do dia 23 de outubro, uma quarta-feira, quando deixamos Rionegro para trás. Alguns quilômetros depois paramos em um posto de gasolina para ver se era possível pagar com cartão de crédito. A resposta foi não e a informação a seguir não agradou: teríamos que voltar cinco quilômetros até El Santuário, ou seguir em frente por pelo menos duas horas, onde encontraríamos a próxima cidade na qual esse tipo pagamento era possível. A gasolina não daria para tanto. 

Sem alternativa, retornamos, abastecemos e pegamos a estrada de novo. E mais uma vez fizemos o que não deveríamos fazer: viajar de noite, mesmo que somente até às 19:30. Naquele dia, mesmo que a gente quisesse, não daria para ir muito longe, pois acabou a embreagem da Honda Bros do Jadir. Nem imaginávamos que tínhamos acabado de chegar perto de um lugar para onde os holofotes da imprensa mundial estiveram virados por muito tempo, numa comunidade chamada Doradal, onde está uma antiga fortaleza de Pablo Escobar, um dos maiores traficantes de cocaína que o mundo já conheceu.

Foto com a gerente e parte da equipe do hotel
Assim que chegamos ao hotel, um motoqueiro colombiano viu que tinha alguma coisa errada com a moto do Jadir. Solidário como muitos outros colombianos que encontramos, ele foi logo atrás de um mecânico. Em quinze minutos estava de volta. O mecânico viu que o problema era mais sério e disse que só no dia seguinte poderia fazer alguma coisa. De manhã cedo fomos para a oficina e, de fato, a coisa estava complicada. Chegamos às sete e o local só abriu às oito da manhã.

Quando o mecânico abriu a moto viu que o disco de embreagem estava danificado e a moto só voltaria ao normal se o mesmo fosse trocado. Nesse ponto enfrentamos novo dilema, pois o cara não queria desmontar por se tratar de uma moto, ainda na garantia. Foi preciso o Jadir se responsabilizar, dizendo que assinaria uma autorização, se fosse preciso, pois queria sua moto rodando normalmente. Antes de qualquer trabalho ainda ligaram para a cidade de Cali, para uma concessionária Honda, para saber se podiam fazer o trabalho. 

Por baixo desse lago passava um túnel de fuga de Escobar
Só então resolveram mexer na máquina, na qual foi colocado um disco que não era original, embora o mecânico tivesse garantido que era dos bons. E era, porque aguentou o restante da viagem. E o mecânico também era bom.

Mas, Doradal não foi só dissabores. Uma grande surpresa ainda nos aguardava. Depois que a Bros estava pronta, fomos para o hotel buscar nossas mochilas. Na saída em direção a Cali entramos para visitar a antiga fortaleza de Pablo Escobar, que por muitos anos foi chefe supremo do Cartel de Medelim. Trata-se de uma série de construções onde o antigo rei do tráfico dava festas nababescas, para as quais ele contratava os mais famosos artistas colombianos da capital Bogotá. Preferência para mulheres bonitas, cantoras, atrizes ou não. Na região próxima desse local produziu-se muita cocaína nos tempos de domínio de Escobar.

Os guias, funcionários do governo da Colômbia, nos mostraram tudo, incluindo as saídas secretas por onde Escobar podia fugir se fosse cercado. Havia um túnel de quase um quilômetro cuja saída dava para a rodovia, o qual passava sob um pequeno lago artificial. 

Havia, também, um grande salão para festas, sala para recepções e um grande número e outras salas e quartos.
A igreja construída por Pablo Escobar

Uma coisa que chamou muito nossa atenção foi uma igreja que Pablo Escobar mandou construir bem perto de sua casa, a qual ele costumava frequentar. Dizem as boas e as más-línguas, que na igreja ele ia recomendar a alma daqueles que ele mandava matar. 

Então, de fato, ele deve ter ido lá muitas vezes, porque não foram poucos os que ele mandou mais cedo para o chamado andar de cima. Atualmente funciona um hotel de luxo numa pequena parte do complexo, que foi confiscado pelo governo da Colômbia, que está recuperando o local para ser explorado pelo turismo.

Ao meio-dia pegamos a estrada rumo a Cali, que ainda estava longe, enfrentando um longo trecho de subida. Saímos de 1.100 metros para chegar aos 3.586 metros de altitude, onde, literalmente, passeamos entre as nuvens. A essa altura já tínhamos decidido cortar caminho, riscando Bogotá da nossa Rota. Iríamos para Manizales e de lá continuaríamos rumo ao Sul, para Cali. Nesse trecho pegamos um frio brabo, com uma temperatura de seis graus Celsius. Com a velocidade das motos, mesmo estando bem protegidos, parecia que a gente ia congelar. Mas, o cenário era maravilhoso, o que nos rendeu belas fotos, incluindo o famoso Nevado Ruiz, o mais famoso monte da Colômbia, do qual falarei um pouco no próximo capítulo.

Jota Parente

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