domingo, julho 15, 2018

Paulo César Cajú já dizia um mês antes da copa, que a seleção não lhe inspirava confiança

Resultado de imagem para foto de paulo césar cajúO Globo. Entrevista concedida em maio, um mês antes da Copa do Mundo

Paulo Cezar Caju é um homem de bom gosto futebolístico. Quando adolescente, se deleitava vendo da beira do campo os treinos do Botafogo de Nilton Santos, Garrincha, Didi, Amarildo, Quarentinha e Zagallo comandados por seu pai adotivo, Marinho Rodrigues. 

Depois, como jogador de fino trato com a bola, fez parte de esquadrões como o Botafogo de 1968 com Jairzinho, Gérson, Roberto Miranda e Rogério, a Seleção de 1970 (foi titular nos jogos contra Romênia e Inglaterra) e a máquina do Fluminense de 75/76 com Rivellino, Carlos Alberto Torres, Dirceu, Doval, Pintinho, Gil e outras feras. Por ter jogado com tantos craques (a favor e contra, como gosta de ressaltar), ele não admite meios-termos quando fala de futebol: ou o time joga bem, com técnica e ousadia, ou ele lhe vira as costas. “Deixei de me importar com o Botafogo, meu time do coração, faz tempo por causa disso. Há quantos anos não temos um time que dá gosto ver jogar? Esse negócio de time guerreiro ou de jogar por uma bola não é comigo.”


Você gostou da lista de convocados do Tite para a Copa do Mundo?
Não me entusiasmou nem um pouco, como não me entusiasma a sua Seleção. Não gosto do jeito de jogar do time, é uma continuação da decadência do futebol brasileiro que começou nos anos 90 e que nos afasta cada mais vez das nossas origens. O que eu vejo não é o futebol brasileiro, por isso não vou torcer para o Brasil na Copa. Aliás, faz tempo que não consigo torcer para o Brasil. Vou torcer para quem estiver jogando o futebol mais bonito, eu gosto é de futebol bem jogado.
Na sua opinião o que levou o Brasil a se afastar de seu estilo?
Esse processo começou em 90, com o Lazaroni, e ganhou força definitiva em 94 quando o Parreira ganhou a Copa (em 94 nos Estados Unidos) com um time que era a antítese do futebol brasileiro. Vai me desculpar, mas um meio-campo com Mauro Silva, Dunga, Mazinho e Zinho não representa o futebol brasileiro. Era um meio-campo defensivo, cuja função era proteger a defesa e não criar jogadas. O time tinha oito jogadores para defender e dois definidores excepcionais na frente que eram Bebeto e Romário. Ganhou apertado dos Estados Unidos, empatou com a Suécia, depois ganhou apertado da Suécia na semifinal, não fez gol em 120 minutos na final e se deu bem nos pênaltis. Foi a vitória do futebol pragmático, da ideia de que primeiro é preciso defender. É a aposta na eficiência: a gente não toma gol e um dos dois lá da frente acha um para ganharmos. Demos o azar de ganhar aquela Copa com um time duro de ver, e aí a praga do futebol de resultados se alastrou até tomar conta de vez do nosso jogo. Futebol brasileiro não é isso, é drible, é tabelinha, é chapéu, é caneta… Hoje se você põe o adversário na roda e dá um balãozinho dizem que é desrespeito e querem te bater. Uma chatice!
Então a origem do mal é a Seleção de 94, Caju?
Com o título ganho pelo Parreira houve uma invasão de professores de educação física ocupando o cargo de treinador, gente que não pode aprimorar os fundamentos do jogador porque não sabe bater na bola, não sabe dominar, se posicionar… O futebol do Rio, que tinha irreverência e leveza, foi contaminado por esse jogo sem graça e feio, mais parecido com a escola gaúcha. 
E tome técnico gaúcho na Seleção: Felipão, Dunga, Mano, Tite… Antes a gente treinava pra envolver o adversário, pra atacar. Hoje ninguém quer a bola, porque não sabe o que fazer com ela. É melhor deixá-la com o adversário e tentar fazer o gol quando ele errar. Os técnicos treinam para o time se defender e tentar arrumar uma bola parada. Ao invés de apostar na bola rolando, apostam na bola parada! Para piorar o quadro, junto com os professores de educação física vieram o que chamo de “analistas de computador”, os comentaristas que adoram números, teorias e termos ridículos como “ligação direta”, “jogador agudo” e “leitura de jogo”. No meu tempo ligação direta era o que o ladrão fazia para roubar o carro sem precisar da chave, ligava um fio no outro e ia embora.
Você não acha que a Seleção melhorou em relação ao que era com o Dunga como técnico?
Melhorou, mesmo porque não dava para piorar. Mas o conceito é o mesmo, de muito cuidado com a defesa e pouca criatividade. O Tite mudou alguns jogadores, trouxe de volta o Marcelo, que para mim é craque e não jogava com o Dunga, os resultados melhoraram e em consequência disso o clima também melhorou. Mas é a escola gaúcha dominando. E não vamos nos iludir com os resultados nas Eliminatórias, porque o nível da competição foi bem fraco. Copa do Mundo é outra história.

Caju, vamos voltar à lista do Tite: por que você não gostou?
Olha, dos 23 chamados eu só vejo dois craques: Marcelo e Neymar. E na Seleção eles ainda não renderam numa competição o que rendem nos clubes, é bom que se diga. Copa do Mundo é torneio de tiro curto, você precisa ter no campo e no banco o maior número possível de jogadores com capacidade para decidir uma partida. Temos bons jogadores como Willian, Coutinho, Douglas Costa… Mas tem gente que não sei o que vai fazer na Rússia.
Por exemplo?
Em primeiro lugar, não gosto dessa panela do Corinthians. Começa com o Edu Gaspar, aí vem a comissão técnica,  o Cássio, o Fágner, o Renato Augusto, o Paulinho… O Renato Augusto está morto lá na China, o Paulinho virou reserva do Barcelona. Mas o pior é o Fágner, achei um absurdo a convocação dele. É um cara desleal, um “assassino”, entra com maldade. Ter um cara como ele no grupo não combina com o discurso de jogo limpo do treinador.
E o Taison? 
O Taison vai lá para quê, vai entrar quando? Quando o time estiver perdendo nas quartas de final a 15 minutos do fim? Claro que não! Se o jogo complicar não dá pra colocar Taison, Renato Augusto…
Gabriel Jesus ou Firmino?
O Firmino evoluiu no Liverpool, se entende bem com Salah e Mané, mas acho que não é um jogador top, de nível para brilhar numa Copa do Mundo. Gosto muito do Gabriel Jesus, tecnicamente ele é muito bom. Precisa ganhar malícia para evitar os choques, porque me parece um pouco frágil e muito sujeito a se machucar.
De primeira, Caju: quem ficou fora da lista e você levaria?
O Luan, fácil. Se jogasse lá fora, num Shakhtar Donetsk da vida, acho que teria mais chances de ser chamado. É criativo, joga solto, é inteligente, não se esconde e vem jogando com muita confiança.
O Tite foi transformado numa espécie de “salvador da pátria”, suas decisões raramente são contestadas. O que você acha disso?
Uma grande ilusão. A imprensa ajudou muito a criar essa imagem, vendendo para o público que agora vai, rumo ao hexa, essas bobagens… Já falei, ele escolheu os jogadores melhor do que o Dunga, mas é adepto do futebol pragmático também. Para ser sincero, acho o Tite um grande oportunista. Apoiava o Bom Senso, metia o pau na CBF, pedia a renúncia do Del Nero e acabou de beijos e abraços com ele na frente das câmeras. Ele é bom de papo, um cara esperto, seduz as pessoas com aquela conversa, aquele dialeto que ele fala. Dizem que é o “Titês”, mas eu chamo de “Chatês”. Ser oportunista é moda no Brasil. Não temos um presidente que não foi eleito e fala em se reeleger? (risos)
Você critica muito a escola gaúcha de treinadores. O comentário hoje é forte de que o número um na linha de sucessão do Tite, caso ele não fique depois da Copa, é o Renato Gaúcho. O que você acha disso?
Pelo amor de Deus, só pode ser brincadeira… Acho uma grande injustiça darem ao Renato todos os méritos pelos bons resultados recentes do Grêmio. Quem deu a cara pro time foi o Roger Machado!. Ele pegou um time que não jogava nada na mão do Felipão, que foi recebido de braços abertos pelo clube mesmo depois do 10 a 1 na Copa do Mundo, e mudou completamente o jeito de jogar. Passou a ser um time leve, de toque de bola, com jogo coletivo, um time agradável de se ver.
Você acabou de elogiar o Roger Machado, e ele  é gaúcho, Caju…
É uma exceção. O Roger foi um lateral forte fisicamente, não muito técnico, mas como treinador gosta de times técnicos, que joguem bola.

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