terça-feira, outubro 03, 2017

Perplexos, EUA buscam motivos para ação de atirador de Las Vegas

 WASHINGTON - O cenário de festa permanente de Las Vegas fez com que muitos que estavam num festival country na noite de domingo pensassem, por alguns instantes, que o barulho dos tiros que vinham do 32º andar do Hotel Mandalay Bay fossem fogos de artifício. Mas em pouco tempo ficou claro que se tratava de uma tragédia, o maior massacre causado por armas de fogo na História moderna dos Estados Unidos, com 59 mortos e 527 feridos, 20 deles ainda em estado crítico — números que devem aumentar.

O que ainda continua nebuloso é a motivação do autor da tragédia, o aposentado divorciado Stephen Paddock, de 64 anos. A polícia levou 72 minutos para localizar o atirador, que foi encontrado morto no quarto do hotel. E o país e o mundo ficaram chocados com o verdadeiro arsenal de guerra em posse de Paddock: 23 armas, dentre elas pelo menos oito fuzis, foram encontrados no local do crime; em sua casa, em Mesquite, ao norte de Las Vegas, a polícia achou mais 19 armas, explosivos e milhares de cartuchos munição, o que novamente reabriu o debate sobre o controle de armas nos EUA. Em seu carro ainda foi encontrado nitrato de amônia — fertilizante que pode ser usado para fazer explosivos.

‘PARECIA UMA CENA DE GUERRA’
Segundo a CNN, a loja Guns & Guitars, em Mesquite, vendeu algumas armas para o aposentado. Em nota, a empresa confirmou que Paddock comprou armamento no local, mas disse que todos os requisitos necessários para a venda foram cumpridos. “Ele nunca deu nenhuma indicação ou motivo para acreditar que era instável ou impróprio em qualquer momento.

Estamos cooperando com a investigação em andamento das forças locais e federais.”

O atirador usou um martelo para quebrar duas janelas do quarto do hotel, onde se hospedou na quinta-feira passada. Dali, posicionou pelo menos dois rifles, de acordo com as autoridades, disparando a uma distância de 366 metros do local onde cerca de 22 mil pessoas assistiam ao show do cantor country Jason Aldean. O desespero das pessoas, que não sabiam como agir ao ouvir os disparos, agravou a situação: assustadas, muitas se jogaram no chão, fazendo com que outras caíssem durante a fuga e acabassem pisoteadas. Robert Hayes, um bombeiro de Los Angeles que assistia ao show perto do palco, disse que primeiro pensou que os tiros fossem um barulho causado pelo mau funcionamento de algum equipamento, mas rapidamente se juntou aos socorristas.


— Provavelmente declarei mortas de 15 a 20 pessoas — contou à Fox News. — Parecia uma cena de guerra.

Mas o cenário de desespero no momento do massacre, classificado pelo presidente Donald Trump como “um ato de pura maldade”, não combina com o perfil do assassino, um aposentado de 64 anos, que tinha uma vida tranquila e era um grande apostador: segundo registros dos cassinos, ele chegava a apostar de US$ 20 mil a US$ 30 mil por noite. Após um minuto de silêncio pelas vítimas, Trump lembrou que as respostas ainda não são claras.

— Sei que estamos buscando algum tipo de significado no caos, algum tipo de luz na escuridão. O FBI e o Departamento de Segurança Interna estão trabalhando com as autoridades locais para ajudar na investigação, e vão fornecer atualizações — afirmou, anunciando que irá amanhã a Las Vegas e elogiando os socorristas. — A velocidade com que eles agiram foi milagrosa. Encontrar o atirador tão rápido é algo pelo qual nós sempre seremos gratos.

O que mais intriga até o momento é a falta de motivação aparente para o crime. O FBI descartou que Paddock tivesse se inspirado no Estado Islâmico, que reivindicou a autoria do ataque — como já vem fazendo em outros casos envolvendo lobos solitários, muitas vezes sem veracidade. A Amaq, órgão de propaganda do grupo, chegou a afirmar que Paddock era “um soldado do EI” que se “converteu ao Islã há alguns meses”, mas o FBI rapidamente descartou o vínculo.

— Não determinamos até agora nenhuma conexão com um grupo terrorista internacional — disse o agente Aaron Rouse.

De fato, Paddock não tinha antecedentes criminais nem registros de prisão — apenas uma citação por infração de trânsito. Além de contador, tinha licença de piloto e permissão para caça de animais de grande porte, válida para o Alasca. Por vários anos, viveu com a namorada, Marilou Danley, numa comunidade de aposentados em Reno, em Nevada. O casal também tinha uma casa em Mesquite, uma pacata comunidade ao norte de Las Vegas, e dividia-se entre os dois locais. Atualmente em Tóquio, Marilou está colaborando com a investigação e será interrogada assim que retornar aos EUA. Mas, segundo a polícia, ela não parece ter qualquer envolvimento.

Sua família também se mostrou surpresa — apesar de seu pai ter figurado, nos anos 1960, como um dos mais procurados pela polícia americana por participação em roubos. Em entrevistas a TVs locais, seu irmão afirmou estar chocado e disse que nunca desconfiou de que Paddock pudesse fazer algo do gênero. Segundo Eric Paddock, o atirador era um homem de posses, que enriqueceu com investimentos imobiliários.

— Onde diabos ele conseguiu armas automáticas? Não tinha antecedentes militares nem nada disso — disse Eric à CBS News, negando que o irmão tivesse afiliação política ou religiosa. — Era um cara normal, morava em Mesquite, e jogava em Las Vegas. Fazia coisas normais, comia burritos.
Ainda de acordo com ele, o atirador não era “ávido por pistolas”.
— Algo se rompeu nele, algo aconteceu. É como se um asteroide tivesse atingido nossa família — reiterou, em entrevista ao jornal “Las Vegas Review-Journal”. — Não temos ideia do que aconteceu.

Os vizinhos dizem que normalmente interagiam com Marilou, mas não com Paddock, que era extremamente introvertido.

POLICIAL ENTRE OS MORTOS
Ao longo do dia, algumas vítimas começaram a ser identificadas, dentre elas dois canadenses: uma delas, a bibliotecária Jessica Klymchuk, de 34 anos, que morava com o marido e quatro filhos em Alberta. Dentre os americanos, morreram o policial Charleston Hartfield, de 34 anos, que estava de folga; Adrian Murfitti, de 35 anos, pescador e comerciante que vivia no Alasca e passava as férias em Las Vegas; Quinton Robbins, estudante universitário de 20 anos; Lisa Romero, secretaria de um colégio no Novo México; Jordan McIldoon, aprendiz de mecânico; e Sonny Melton, enfermeiro de 29 anos, do Tennessee.

O massacre ocorreu em uma das cidades mais turísticas do mundo, terra dos cassinos e de shows. E não interrompeu em parte o clima festivo de Las Vegas: menos de 12 horas após o massacre, a maioria dos cassinos, incluindo o local de onde partiram os disparos, continuara funcionando normalmente. Segundo levantamento do site massshootingtraker.org, apenas este ano morreram 460 pessoas em chacinas com ao menos três vítimas, contra 421 em igual período do ano passado.

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