sexta-feira, outubro 20, 2017

Corrupção aprende-se em casa

Marilene Parente – Artigo da edição 234ª do Jornal do Comércio,  circulando
Do jeito que a corrupção se enraizou no meio da sociedade brasileira, se não fosse tomada nenhuma providência, não se sabe a gente iria para, pois fomos nos acostumando com a ideia de que é normal roubar o erário público. O rouba, mas, faz, que teve origem nos longínquos anos 1950, com Ademar de Barros Filho, em São Paulo, aprimorado por Paulo Maluf, a partir dos anos 1980, quase virou uma instituição nacional.
O conceituado filósofo brasileiro Mário Sérgio Cortella, ao responder a um questionamento de Fátima Bernardes, no programa Encontros, sobre se é a ocasião que faz o ladrão, afirmou que a ocasião revela o ladrão. Ou seja, a pessoa que tem índole corrupta, só precisa que apareça a oportunidade para se revelar publicamente.
Corrupto é quase um eufemismo para se denominar ladrões de colarinho branco. Ladrão é o pobre que rouba pouco, que faz gato de energia elétrica, gente que nunca teve chance de meter a mão numa bolada grande, porque nunca ocupou um cargo importante. Já o corrupto é aquele ladrão que ganha fama nacional roubando dinheiro da educação, da saúde e de programas de assistência social, sem nenhum peso na consciência.
O corrupto, ou ladrão de colarinho branco é, muitas vezes, mais pernicioso do que perigos bandidos que promovem assaltos, pois, o corrupto pode matar muito mais gente quando tira dinheiro da merenda escolar, quando desvia recursos para custear tratamentos médicos de quem não tem como pagar um plano de saúde, ou para comprar medicamentos.
Quando falta dinheiro para compra de produtos para creches e escolas públicas porque a verba foi desviada por corruptos, provocando a falta de dinheiro para botar comida na mesa das crianças, que muitas vezes só tem aquela refeição, esses ladrões ajudam a promover a evasão escolar e o retardamento do desenvolvimento de milhares de crianças.
Antes dessas operações todas, do Ministério Público Federal, da Polícia Federal e do Poder Judiciário em nível federal, ser corrupto no Brasil era praticamente um status. E o mais impressionante é que esses gatunos públicos e privados, eleitos, ou não, adoram roubar à vontade, mas, querem ser reconhecidos como benfeitores da humanidade, quando aprovam uma emendinha para esse ou aquele município. Ficam muito deprimidos quando são pegos com a mão na grana alheia.
O título deste artigo, Corrupção Aprende-se em Casa, tem o objetivo de chamar atenção dos pais, que ligam a TV para assistir a um telejornal sempre recheado de notícias sobre corrupção. Tem sido assim no Brasil, já faz uns cinco anos, pelo menos. E a gente assiste a tudo, na maioria das vezes, sem a preocupação de chamar os filhos para verem as notícias, pelo menos de vez em quando, comentando com eles o que se passa, a gravidade da situação e quão pernicioso é a malversação de recursos públicos.
Os filhos aprendem corrupção em casa, no meio da família, quando veem os pais tentarem corromper guardas de trânsito ao serem pegos com documentação vencida do veículo, ou CNH vencida. Da mesma forma, quando veem o gateiro subir no poste para fazer um gato de energia elétrica, e de quebra, ainda ouvem o pai ou mãe dizer que está fazendo aquilo por que a conta de luz está muito cara. E por aí vão os exemplos de como formar um futuro corrupto a partir da nossa casa.
Li um texto na internet sobre comportamento de usuário de transporte público na Suécia. Um brasileiro que estava passeando por Estocolmo entrou em um metrô, onde viu uma catraca pela qual não passava ninguém, e não havia nenhum funcionário controlando. Quis saber com uma funcionária, se estava quebrada. Não estava, informou a moça consultada. É para pessoas que por algum motivo não podem pagar. Mas, as pessoas que podem, não a usam para passar de graça, perguntou ele. Porque fariam, perguntou ela de volta. E o brasileiro se deu conta de que estava num país onde honestidade é uma virtude comum, não, uma exceção. Que bom, se aqui fosse assim!

Marilene Parente – Bacharel em Direito pela Universidade do Grande ABC

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