sexta-feira, março 20, 2015

"Nós não somos otários", diz padre diante de empresários e vereadores de Santarém

“Assumam o seu papel de defensores dos direitos nossos. Os senhores foram eleitos por nós para nos defender, por isso assumam o seu papel. Só isso, porque os que antecederam vocês 12 anos atrás foram criminosos ao assinarem o projeto do porto da Cargill”, disse Padre Edilberto Sena na sessão da Câmara.

À maneira do ex-ministro Cid Gomes, que deixou o Ministério da Educação por ter chamado os deputados federais de “achacadores” durante uma reunião pública em Belém, e de haver repetido a afirmação em sessão da Câmara Federal,ontem, 18, também no Pará, no município de Santarém, um episódio semelhante promete tornar o padre e militante de causas sociais, Edilberto Sena, coordenador da Comissão Diocesana Justiça e Paz, persona non grata aos vereadores locais.

Padre Edilberto
 Anteontem, 17, o religioso, juntamente com um grupo de militantes e membros de associações populares esteve numa sessão da Câmara Municipal para falar da manifestação que pretendem realizar no próximo domingo, dia mundial da água, visto que o grupo integra as lutas locais contra a instalação de portos privados de empresas exportadores que chegam à cidade de Santarém. Segundo Padre Edilberto, esses portos, assim como ocorre em Itaituba, comprometem seriamente a salubridade do Rio Tapajós e de lagos circunvizinhos.

Os vereadores levaram um susto quando o religioso, chamado para dar a sua palavra da tribuna, disse, sem pestanejar, aos vereadores: “Assumam o seu papel de defensores dos direitos nossos. Os senhores foram eleitos por nós para nos defender, por isso assumam o seu papel. Só isso, porque os que antecederam vocês 12 anos atrás foram criminosos ao assinarem o projeto do porto da Cargill”. A Cargill é uma grande empresa de origem norte-americana que transporta soja do porto de Santarém para o exterior, com seu terminal localizado sobre um sítio arqueológico. Segundo os movimentos sociais, a empresa opera há muitos anos de modo ilegal no município.

Antes, Edilberto havia dito: “Vou ser curto e direto ao tema. Sou coordenador da Comissão Justiça e Paz da Diocese de Santarém. Esta reivindicação vai a três grupos aqui presentes: aos empresários, ao plenário e aos vereadores. E esquematizou a reivindicação:

a) “Aos empresários: os senhores podem implantar as suas empresas e gerar seus lucros, mas não como e onde querem. Nós não somos otários;

b) Ao plenário: precisamos nos unir e lutar juntos por nossos direitos e não aceitar imposições que nos prejudicam. Não nos fiemos nos políticos, temos que agir como sociedade que resiste a imposições sobre nossos direitos; e se aceitarmos, aí sim, seremos otários”.

Tudo isso não levou mais que 4 minutos. “Fui inscrito para falar pela Comissão Justiça e Paz da Diocese, após as falas oficiais das associações de moradores, da Pastoral Social, Famcos, Unecos, etc., e depois dos empresários envolvidos”. O presidente da mesa, vereador Reginaldo Campos, antes das falas dos empresários, resolveu modificar a dinâmica da sessão, passando a palavra aos inscritos, sendo o padre Edilberto chamado por primeiro.

Em vista do ocorrido, os vereadores decidiram remeter uma carta ao bispo dom Flávio Giovenale, repudiando as palavras do padre Edilberto. Antes, porém, o padre escreveu ao bispo, dando a sua versão dos acontecimentos. 

Na carta ao bispo, ele afirma: “Ao chegar há pouco, na Pastoral Social, fui informado que meu pronunciamento na Câmara causou impacto negativo entre os vereadores. Soube também que eles ficaram indignados e estarão enviando carta de repúdio a ser entregue ao sr. Bispo. Não falei nenhuma vez a palavra “corrupto”. Mas imagino que ao dizer que nós, do plenário, não devíamos nos fiar nos políticos, eles podem ter interpretado que os acusava de corrupção”.

Prossegue a explicação:

“Frisei que nós, da sociedade civil organizada e ameaçada pelas obras do progresso em Santarém, não vamos nos fiar nos políticos. É que o projeto dos portos novos na periferia da cidade já vem sendo discutido, desenhado e encaminhado há mais de um ano. Nós da Pastoral Social já participamos de várias reuniões e encontros em defesa dos direitos dos moradores dos bairros afetados e do meio ambiente do lago do Maicá. Inclusive, já aconteceu um seminário específico no bairro Pérola do Maicá, com presença da SEMA estadual e Ministério Público Estadual, mas nenhum vereador compareceu e se manifestou em favor dos moradores dos bairros”.

“A Rádio Rural de Santarém já promoveu um debate sobre o tema do projeto dos portos graneleiros. Compareceu, entre outros debatedores, o então secretário de planejamento e desenvolvimento municipal, Valdir Matias, que fez forte defesa das empresas do projeto dos portos. Os vereadores nunca antes participaram de reuniões e encontros com as associações de moradores para escutar o povo”.

Já o vereador Henderson Pinto, que foi o mais escandalizado com o pronunciamento do padre Edilberto Sena, com seu furioso pronunciamento "pode ter desviado o assunto dos portos, cujo plenário da sessão especial se manifestava visivelmente preocupado com os impactos dos tais projetos".

Henderson Pinto é um defensor firme dos projetos portuários. No dia 24 de abril de 2014 em entrevista ao Jornal TapajósNet afirmou o seguinte: “O projeto da Ceagro é viável e representa um ganho em termos de desenvolvimento econômico para o município. Acredito, continuou Henderson, que esse projeto vai nos auxiliar no nosso processo de desenvolvimento, no aquecimento da nossa economia, principalmente na geração de emprego e renda e também, em dividendos para o município de Santarém e toda a região. Eu gostei muito da apresentação da Ceagro e da forma que eles estão pensando para se implementar no município”. 

Finaliza Edilberto: “Assim sendo, compreendo que eles tenham se doído com as colocações que fiz”.

Fonte: blog do Manuel Dutra

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