segunda-feira, junho 23, 2014

*A Copa do Mundo e o nosso complexo de vira-latas

Jota Parente - A 20ª Copa do Mundo, que está sendo realizada no Brasil, tem provocado muitas discussões de todos os tipos e de diversos níveis, dos mais civilizados, aos mais irracionais. Foi cercada de muitas expectativas negativas por causa do atraso nas obras e de muitas críticas por boa parte da população brasileira em virtude dos elevados gastos para a construção de estádios superfaturados.
A cidade de Cuiabá, uma das menores cidades sedes deste mundial inclui-se entre as poucas exceções de cumprimento de boa parte das metas de benefícios extra futebol, pois lá vem sendo feitos significativos investimentos para a melhoria da mobilidade urbana, como pude constatar quando passei de moto por lá em novembro de 2013. No Rio de Janeiro também foi feito algo para melhorar a qualidade do transporte coletivo via ônibus.
Certamente, Manaus é uma das capitais estaduais onde mais seria necessário investir em mobilidade urbana, pois a ligação entre as zonas norte e sul da cidade é muito complicada porque é muito pequeno o número de vias que a cortam. Da mesma forma, ir da zona leste para a zona oeste é muito difícil, mesmo para quem mora lá. Quem não mora, mesmo com auxilia de um GPS tem muitas dificuldades. Mas, na capital amazonense, que conheço muito bem, construíram apenas a Arena da Amazônia.
O prometido BRT (Bus Rapid Transit), um sistema muito rápido de trânsito com utilização de ônibus, criado pelo arquiteto Jaime Lerner, ex-prefeito de Curitiba, que ganhou fama até nos Estados Unidos e na Europa, ficou de ser implantado em várias capitais como uma contrapartida do governo para a população das cidades sedes. Mas, na maioria dos casos ficou na promessa. Inclusive em Manaus.
Na edição 181 do Jornal do Comércio, circulando

Mas, a Copa do Mundo começou, já completou duas semana e agora o melhor que a gente tem a fazer é curtir os jogos pela televisão, como um dos maiores espetáculos da Terra, sem muito ufanismo, sem esquecer que se trata de um grande negócio de bilhões de dólares, cujos maiores lucros irão para os cofres da FIFA, todavia, sem esse complexo de cachorro vira-latas que acomete tantos brasileiros.
Desde abril de 2008 circula um texto na internet, o qual é atribuído a uma escritora holandesa que existe na vida real, mas sem prova alguma de sua autoria. Aliefka Bijlsma, a escritora de verdade, veio ao Brasil em 2008 para lançar seu segundo livro, “Mede namens mijn vrouw”, tendo ficado encantada com o país, como disse mais tarde em uma entrevista a uma revista alemã. Na conversa com a reportagem, ela ressaltou muitas das coisas boas das quais gostou na Terra Brasilis, mas, também falou a respeitos de vários dos nossos problemas, como seria de esperar de alguém com espírito crítico e que diz o que pensa com coerência.
Tem muita coisa interessante no texto apócrifo cujo autor deve ser algum brasileiro travestido de patriota, que no entanto, colocou muitas comparações que nada tem de verdadeiras. Mas, se tem algo que não se pode negar é quando ele diz que os brasileiros acham que o mundo todo presta, menos o Brasil; realmente, parece que é um vício falar mal do Brasil. Todo lugar tem seus pontos positivos e negativos, mas no exterior eles maximizam os positivos, enquanto no Brasil se maximizam os negativos. Esse é o tal do complexo de vira-latas que nos persegue, inclusive agora, nos momentos de preparação e de execução do evento Copa do Mundo de Futebol.
Nós estamos jogando fora a maior oportunidade que o nosso País já teve de mostrar para o mundo tudo do que somos capazes, quem somos de verdade e nossa capacidade de superar dificuldades. Vai demorar muitas décadas para surgir outra oportunidade igual a esta, porque a Copa do Mundo mexe com o Brasil de ponta a ponta e é mostrada para o mundo inteiro. Daqui a dois anos vamos ter as Olimpíadas, mas, o evento acontecerá, exclusivamente na cidade do Rio de Janeiro.
Na Copa das Confederações, houve momentos em que o mundo prestou mais atenção aos atos que misturaram protestos com banditismo, do que nos jogos. Na Copa do Mundo as atenções são maiores para os jogos, mas, isso não impede que sejam vistas imagens negativas de protestos e novamente de vandalismo. A polícia tem sido mais enérgica e tem baixado o cacete nos radicais, como é feito em qualquer país. Protestar é um direito do cidadão de bem; destruir patrimônio, público ou privado é coisa de bandido, de malfeitor, de vândalo. Como disse o Ronaldo Fenômeno, nesse pessoal que quer quebrar tudo a política tem que baixar o porrete.
Façamos uma analogia entre o Brasil e a família da gente. Toda família tem os seus problemas internos, que devem ser discutidos no seio familiar. Se alguém de fora vem se intrometer a gente pula e diz: Espera aí! Isso é assunto nosso, não se meta! Da mesma forma deveríamos agira quando mexem com nosso País. Mas, nosso complexo de vira-latas nos impede de agir dessa maneira.
Três dias após a estreia do Brasil contra a Croácia, o mais respeitado jornal do mundo, o The New York Times publicou matéria, sem inferências, retoques e muito menos truques; o jornal mais influente do planeta mostra a importância decisiva do futebol, da Seleção e da Copa do Mundo no Brasil como fatores de união nacional; explosão de alegria a cada gol da equipe na abertura do Mundial é mostrada de ponta a ponta do País, em diferentes estratos da sociedade; câmeras foram instaladas pelo NYT do Oiapoque a Porto Alegre; vídeo de repercussão global mostra o que a mídia tradicional brasileira (Globo, Folha, Veja, Estadão etc...) não quis ver: povo de braços abertos festeja a copa das copas.
Considerado o jornal mais influente do mundo há muitos anos, o The New York Times acaba de dar uma lição de como fazer mídia. Sem retoques, artifícios e, muitos menos, truques, o setor eletrônico da publicação instalou câmeras automáticas para documentar a reação de brasileiros comuns, de ponta a ponta do País, durante a partida de abertura da Copa do Mundo, entre Brasil e Croácia. O que se vê nas imagens da explosão de alegria a cada gol da Seleção Brasileira é uma festa real e autêntica, que ressalta a importância do futebol, da equipe nacional e da Copa do Mundo no Brasil como fatores imprescindíveis para a unidade de um país de território continental.
O vídeo do NYT que pode ser acessado na internet mostra cenas das reações aos gols entre militares no Rio de Janeiro, aposentados em Porto Alegre e ribeirinhos do Oiapoque, no extremo norte do Brasil, entre outras. A reação é sempre a mesma, de incontida alegria. Exatamente como sempre acontece, aconteceu e continuará acontecendo. Ainda que, neste 2014, a mídia familiar e tradicional tenha se esforçado para desviar esse traço do caráter nacional, acentuando todos os problemas na organização do Mundial, que existem e estão ai, mas sem, no entanto, mostrar corretamente as qualidades da iniciativa. Na prática, boicotando-a.
Com o vídeo que repõe para o mundo, em milhões de reproduções, o inabalável amor dos brasileiros pelo seu time e seu País, o New York Times, sem uma usar uma única palavra, fez mesmo um golaço.
            Somos um país heterogêneo, com 200 milhões de habitantes? Sim, somos, mas, os Estados Unidos, onde fica a sede do The New York Time, tem 314 milhões de habitantes, com uma população muito mais heterogênea do que a brasileira e quando alguém de fora resolve intrometer-se em assuntos que dizem respeito à nação americana, o sentimento de defesa da pátria aflora e todo mundo parte para a briga.
            A Copa do Mundo não deve funcionar como um tapete para baixo do qual devamos jogar toda a sujeira. Os problemas existem, e muitos deles por causa de nossa passividade histórica, que parece estar mudando um pouco. Entretanto, perder uma oportunidade como esta de mostrar para o mundo o que o Brasil tem de bom é, no mínimo, uma baita falta de inteligência. A roupa suja a gente lava em casa. Não adianta falar para os de fora que ela está suja, porque eles não virão lavá-la para nós. Então, aproveitemos o que há de bom na Copa do Mundo do Brasil.

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