segunda-feira, abril 26, 2021

Países governados por populistas, como Brasil e México, sofrem mais com a pandemia

Faz grande diferença se os políticos se importam com seus cidadãos e se acreditam na ciência

Yascha Mounk

O cientista social Yascha Mounk é professor associado na Universidade Johns Hopkins e autor de "O Povo contra a Democracia".

A pandemia não tem lugar para narrativas simples.

A maioria das previsões que as pessoas fizeram há um ano se revelaram falsas. As democracias não se saíram sistematicamente melhor que as ditaduras. E o Estado não se mostrou mais eficaz que a economia global em lidar com as reviravoltas provocadas pela pandemia.

Mas um contraste simples traçado talvez se mostre acertado, afinal.

Nos primeiros meses da pandemia, muitos observadores argumentaram que países governados por líderes populistas que não confiavam na ciência e negavam a gravidade da pandemia sofreriam resultados piores. Possivelmente, especularam, isso até atrasasse ou revertesse a ascensão aparentemente inexorável dos líderes populistas nos últimos dez anos.

Então alguns países governados por políticos moderados, como França e Alemanha, enfrentaram dificuldades, enquanto alguns dos países governados por populistas autoritários, como Polônia e Hungria, pareceram estar se saindo surpreendentemente bem. A ideia de que os governantes populistas se sairiam especialmente mal acabou parecendo ser mais uma das teorias amplamente aceitas que não sobreviviam à fogueira dos vírus.

Tragicamente, esse não é mais o caso. Quanto mais tempo a pandemia vem durando, maior importância vem ganhando a qualidade da governança. Se lançamos um olhar ao mundo hoje, fica dolorosamente claro que os países governados por populistas vêm pagando um preço especialmente alto em termos de prejuízos econômicos, número de casos de Covid e mortalidade.

Sob a liderança errática de Jair Bolsonaro, o Brasil tornou-se uma das nações mais duramente atingidas do mundo. Hoje o país registra milhares de mortes por Covid quase todos os dias. Hospitais em todo o país permanecem absolutamente sobrecarregados. Em São Paulo, as autoridades anunciaram recentemente que pretendem abrir um “cemitério vertical” para dar conta de todos os corpos excedentes.

Mais ao norte, o México está desabando rapidamente sob pressão semelhante. O tratamento dado à pandemia por Andrés Manuel López Obrador vem sendo similarmente irresponsável. A catástrofe nacional agora está sendo inteiramente exposta, finalmente. Nos últimos meses o México teve 300 mil mortes a mais do que a média, e hospitais superlotados em todo o país rejeitam pacientes que poderiam facilmente ser salvos se pudessem ter acesso a atendimento médico.

O triunvirato das grandes democracias derrubadas por líderes populistas se completa com o país mais fortemente atingido pela pandemia no mundo: a Índia de Narendra Modi. Embora a maior parte da população continue sem acesso a testes do vírus, centenas de milhares de indianos hoje recebem diagnósticos da doença diariamente. O número de casos quintuplicou em menos de um mês, e o governo ainda não tem um plano coerente para enfrentar a pandemia.

As evidências do custo do populismo em termos da pandemia crescem em outros lugares também. Bolívia, Equador e Filipinas também fazem parte dos países mais afetados do mundo. E nos Estados Unidos, a transição de Donald Trump para Joe Biden evidenciou quanto um governo competente pode fazer para melhorar a situação, mesmo quando ele chega ao poder em uma fase já adiantada do problema.

Aqueles de nós que nos sentimos horrorizados com a ascensão do populismo nos últimos dez anos devemos interpretar essa realidade como uma confirmação trágica dos nossos piores temores. Fica claro que realmente faz grande diferença, sim, para o bem-estar do público se os políticos se importam com seus cidadãos, se acreditam na ciência e se são ou não restritos por freios e contrapesos que podem controlá-los quando eles saem dos trilhos.

O preço do populismo se revelou ainda mais letal do que poderíamos ter imaginado antes de esta pandemia terrível se alastrar pelo mundo.

Tradução de Clara Allain

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