quinta-feira, janeiro 23, 2020

O Imbróglio do Transporte Por Aplicativo Está Longe de Terminar em Itaituba


Resultado de imagem para foto sobre aplicativo de transporte de passageiros          Jota Parente - No ardor das discussões do final da tarde de ontem pelo grupo do blog do Jota Parente, a respeito do serviço de transporte de passageiros por carros particulares que usam aplicativo, cheguei a escrever um texto. Concluí que não deveria publicá-lo dada a minha falta de conhecimento sobre o que a prefeitura pode, ou não, sobre esse serviço.
          Resolvi pesquisar, depois de ler o texto da decisão do STF concernente ao tema, o qual é claríssimo quanto à vedação para que municípios legislem sobre autorização ou restrições atinentes ao serviço. Todavia, como não constava da matéria que a Suprema Corte julgava, não há referência alguma a respeito do que pode ou não pode ser feito pelas administrações municipais.
          O assunto chegou à mesa do prefeito Valmir Clímaco, que reuniu ontem com representantes dos taxistas, que é a classe que mais tem protestado contra o serviço, alegando que se trata de concorrência desleal. Aliás, como é caro o serviço de táxi em Itaituba. Não há quem não reclame.
          Em tempos de pré-campanha, cada um interpreta as coisas do jeito que lhe é mais conveniente, todavia, o prefeito foi bastante claro em alguns pontos, sobretudo quando afirmou textualmente que não é contra o transporte de passageiros por esse meio, e que a Câmara seria acionada para aprovar lei que normatize o serviço dentro das competências do município.
          Hoje eu conversei com o Procurador Geral do Município, o advogado Diego Cajado, que disse, que em primeiro lugar, o prefeito não é contra, de forma alguma, ao uso do aplicativo, e que ele é totalmente a favor, por entender que é um serviço importante que se oferece para a população de Itaituba.
          Em segundo lugar, a manifestação do governo municipal é de que haja regulamentação do serviço, observando as conformidades da legislação federal, que especifica que o município tem que regulamentar a questão do recolhimento de tributos, que taxistas e moto-taxistas pagam regularmente. Caso contrário, vira uma concorrência desleal, e “nós temos conhecimento disso”, afirmou Diego.
          “O nosso entendimento é que as empresas que tem interesse em se instalar, tenham representação no município, que tenham CNPJ, que tenham, também, carros com placas do município, haja vista que o recolhimento de IPVA traz retorno para o município, que os condutores tenham certidão negativa de antecedentes criminais, entre outras situações. Estamos examinando todos os pormenores para que se resolva essa situação junto com a Câmara”.
          Na conclusão do julgamento sobre as leis (municipais) que proíbem aplicativos de transporte de passageiros por aplicativo, o Supremo Tribunal Federal decidiu que os municípios não podem criar regras diferentes daquelas estabelecidas em lei federal para regular esse tipo de transporte.
            Na busca por informações para inteirar-me sobre o assunto, encontrei um artigo no site do Conjur, escrito pelo advogado Henry Gonçalves Lemmertz, sócio do escritório Souto Correa, que publico a seguir para quem quiser ler. Sugiro a leitura para quem desejar entender um pouco mais dessa questão.


A Lei nº 13.640/2018 trouxe alterações na Política Nacional de Mobilidade Urbana, introduzindo disposições relativas ao serviço de transporte remunerado privado individual de passageiros intermediado por aplicativos, entre as quais a de que competiria “exclusivamente” aos municípios regulamentar o serviço no âmbito de seus territórios.
Ao assim dispor, no entanto, a Lei nº 13.640/2018 foi mais longe do que poderia.
Isso porque a competência legislativa de cada um dos entes federados - aí incluídos os municípios — é matéria constitucional. Logo, independentemente do que conste na Lei nº 13.640/2018, os limites da competência legislativa dos municípios serão aqueles fixados no texto constitucional. Não pode lei ordinária alterar a partilha das competências legislativas estabelecidas pela Constituição Federal, atribuindo aos municípios competência legislativa que, de acordo com a Constituição, não lhes pertence.

E quais são os limites que a Constituição Federal impõe à competência legislativa dos municípios?

O primeiro limite corresponde à exigência de que se faça presente um “interesse local”. Essa exigência decorre dos próprios termos em que a competência legislativa dos Municípios está definida no texto constitucional, que atribui aos municípios competência para legislar sobre “assuntos de interesse local” e para “suplementar a legislação federal e estadual no que couber” — ou seja, quando houver um interesse local que justifique a suplementação da legislação federal ou estadual pelo município.

Pois bem, o “interesse local” só se faz presente quando existe uma característica peculiar ao município que traduz circunstâncias locais específicas e que faz com que ele possua interesses particulares. Os demais entes federados, por não compartilharem esta característica peculiar do município, não compartilham esse interesse, que se revela, portanto, um “interesse local”. Essa peculiaridade local acaba não sendo apanhada pela legislação federal ou estadual, dada sua generalidade, justificando a edição de uma norma municipal específica.

Por outro lado, não haverá espaço para o exercício da competência legislativa dos municípios quando se tratar de matérias em relação às quais não exista nenhuma peculiaridade em nível municipal, tratando-se de questão comum a vários municípios ou mesmo a todo o país. Da mesma forma, escapam da competência legislativa dos municípios aquelas matérias que envolvam conceituações que, se particularizadas em âmbito municipal, provocariam conflitos e que, por isso, devem ser tratadas em norma geral.

Especificamente no que tange à competência legislativa suplementar dos municípios, além da exigência da presença de um “interesse local”, devem se fazer presentes também outros requisitos específicos. Exige-se, inicialmente, que a matéria que será objeto da legislação municipal esteja abrangida na competência legislativa concorrente da União, dos Estados e do Distrito Federal. Logo, a competência legislativa suplementar dos Municípios não alcança aquelas matérias incluídas na competência legislativa privativa da União. Além disso, as normas municipais deverão conformar-se à legislação federal e estadual suplementada, não podendo contrariá-la.

O segundo limite imposto pela Constituição Federal à competência legislativa dos municípios diz respeito à necessária observância da competência legislativa privativa da União, limite este que se desdobra em dois aspectos.

O primeiro, e mais evidente, é o de que o município não pode legislar sobre aquelas matérias que integram a competência legislativa privativa da União. Em se tratando de competência legislativa privativa, apenas à União é dado editar normas sobre tais matérias, na medida em que a competência legislativa privativa é exclusiva e excludente.

O segundo aspecto diz respeito àqueles assuntos que podem ser enquadrados simultaneamente em matérias que integram a competência legislativa privativa da União e em matérias que integram a competência suplementar dos municípios. Nesses casos, prevalece a competência legislativa privativa da União — que, como se viu, é não apenas exclusiva, mas também excludente — sobre a competência legislativa dos municípios. Vale dizer, ainda que a matéria pudesse ser enquadrada na competência legislativa suplementar dos municípios, uma vez que ela esteja enquadrada também na competência legislativa privativa da União, ela só poderá ser objeto da legislação federal.

Diante dos limites constitucionais da competência legislativa dos municípios, impõe-se como necessária a conclusão de que vários dos aspectos relativos ao serviço de transporte remunerado privado individual de passageiros intermediado por aplicativos escapam da competência legislativa dos municípios.

Esse é o caso daqueles aspectos em relação aos quais não se vislumbra qualquer “interesse local”, como aquele relativo à exigência de uma idade máxima para os veículos — afinal, não há razão para em determinado município os veículos possuírem idade limite diferente daquela aplicável aos demais municípios. É o caso também daqueles assuntos que integram a competência legislativa privativa da União, por dizerem respeito a Direito Civil ou do Trabalho ou a trânsito e transporte.

Como se vê, portanto, apesar da largueza que a Lei nº 13.640/2018 pretendeu dar à competência dos Municípios para regulamentar o serviço de transporte remunerado privado individual de passageiros, a atividade legislativa dos municípios não terá toda essa amplitude, devendo obedecer aos limites que lhe são impostos pela legislação federal.

Advogado Henry Gonçalves Lemmertz

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