Jota Parente - No ardor das discussões do final da
tarde de ontem pelo grupo do blog do Jota Parente, a respeito do serviço de
transporte de passageiros por carros particulares que usam aplicativo, cheguei
a escrever um texto. Concluí que não deveria publicá-lo dada a minha falta de
conhecimento sobre o que a prefeitura pode, ou não, sobre esse serviço.
Resolvi pesquisar, depois de ler o
texto da decisão do STF concernente ao tema, o qual é claríssimo quanto à
vedação para que municípios legislem sobre autorização ou restrições atinentes
ao serviço. Todavia, como não constava da matéria que a Suprema Corte julgava,
não há referência alguma a respeito do que pode ou não pode ser feito pelas
administrações municipais.
O assunto chegou à mesa do prefeito Valmir
Clímaco, que reuniu ontem com representantes dos taxistas, que é a classe que
mais tem protestado contra o serviço, alegando que se trata de concorrência
desleal. Aliás, como é caro o serviço de táxi em Itaituba. Não há quem não
reclame.
Em tempos de pré-campanha, cada um
interpreta as coisas do jeito que lhe é mais conveniente, todavia, o prefeito
foi bastante claro em alguns pontos, sobretudo quando afirmou textualmente que não
é contra o transporte de passageiros por esse meio, e que a Câmara seria
acionada para aprovar lei que normatize o serviço dentro das competências do
município.
Hoje eu conversei com o Procurador
Geral do Município, o advogado Diego Cajado, que disse, que em primeiro lugar,
o prefeito não é contra, de forma alguma, ao uso do aplicativo, e que ele é
totalmente a favor, por entender que é um serviço importante que se oferece
para a população de Itaituba.
Em segundo lugar, a manifestação do
governo municipal é de que haja regulamentação do serviço, observando as
conformidades da legislação federal, que especifica que o município tem que
regulamentar a questão do recolhimento de tributos, que taxistas e moto-taxistas
pagam regularmente. Caso contrário, vira uma concorrência desleal, e “nós temos
conhecimento disso”, afirmou Diego.
“O nosso entendimento é que as
empresas que tem interesse em se instalar, tenham representação no município,
que tenham CNPJ, que tenham, também, carros com placas do município, haja vista
que o recolhimento de IPVA traz retorno para o município, que os condutores
tenham certidão negativa de antecedentes criminais, entre outras situações. Estamos examinando todos
os pormenores para que se resolva essa situação junto com a Câmara”.
Na conclusão do julgamento sobre as leis
(municipais) que proíbem aplicativos de transporte
de passageiros por aplicativo, o Supremo
Tribunal Federal decidiu que os municípios não podem criar regras diferentes daquelas estabelecidas em lei
federal para regular esse tipo de transporte.
Na busca por
informações para inteirar-me sobre o assunto, encontrei um artigo no site do
Conjur, escrito pelo advogado Henry Gonçalves Lemmertz, sócio do escritório
Souto Correa, que publico a seguir para quem quiser ler. Sugiro a leitura para
quem desejar entender um pouco mais dessa questão.
A Lei nº 13.640/2018
trouxe alterações na Política Nacional de Mobilidade Urbana, introduzindo
disposições relativas ao serviço de transporte remunerado privado individual de
passageiros intermediado por aplicativos, entre as quais a de que competiria
“exclusivamente” aos municípios regulamentar o serviço no âmbito de seus
territórios.
Ao assim dispor, no
entanto, a Lei nº 13.640/2018 foi mais longe do que poderia.
Isso porque a
competência legislativa de cada um dos entes federados - aí incluídos os
municípios — é matéria constitucional. Logo, independentemente do que conste na
Lei nº 13.640/2018, os limites da competência legislativa dos municípios serão
aqueles fixados no texto constitucional. Não pode lei ordinária alterar a
partilha das competências legislativas estabelecidas pela Constituição Federal,
atribuindo aos municípios competência legislativa que, de acordo com a
Constituição, não lhes pertence.
E quais são os
limites que a Constituição Federal impõe à competência legislativa dos
municípios?
O primeiro limite
corresponde à exigência de que se faça presente um “interesse local”. Essa
exigência decorre dos próprios termos em que a competência legislativa dos
Municípios está definida no texto constitucional, que atribui aos
municípios competência para legislar sobre “assuntos de interesse local” e para
“suplementar a legislação federal e estadual no que couber” — ou seja, quando
houver um interesse local que justifique a suplementação da legislação federal
ou estadual pelo município.
Pois bem, o
“interesse local” só se faz presente quando existe uma característica peculiar
ao município que traduz circunstâncias locais específicas e que faz com que ele
possua interesses particulares. Os demais entes federados, por não
compartilharem esta característica peculiar do município, não compartilham esse
interesse, que se revela, portanto, um “interesse local”. Essa peculiaridade
local acaba não sendo apanhada pela legislação federal ou estadual, dada sua
generalidade, justificando a edição de uma norma municipal específica.
Por outro lado, não
haverá espaço para o exercício da competência legislativa dos municípios quando
se tratar de matérias em relação às quais não exista nenhuma peculiaridade em
nível municipal, tratando-se de questão comum a vários municípios ou mesmo a
todo o país. Da mesma forma, escapam da competência legislativa dos municípios
aquelas matérias que envolvam conceituações que, se particularizadas em âmbito
municipal, provocariam conflitos e que, por isso, devem ser tratadas em norma
geral.
Especificamente no
que tange à competência legislativa suplementar dos municípios, além da
exigência da presença de um “interesse local”, devem se fazer presentes também
outros requisitos específicos. Exige-se, inicialmente, que a matéria que será
objeto da legislação municipal esteja abrangida na competência legislativa
concorrente da União, dos Estados e do Distrito Federal. Logo, a competência
legislativa suplementar dos Municípios não alcança aquelas matérias incluídas
na competência legislativa privativa da União. Além disso, as normas municipais
deverão conformar-se à legislação federal e estadual suplementada, não podendo
contrariá-la.
O segundo limite
imposto pela Constituição Federal à competência legislativa dos municípios diz
respeito à necessária observância da competência legislativa privativa da
União, limite este que se desdobra em dois aspectos.
O primeiro, e mais
evidente, é o de que o município não pode legislar sobre aquelas matérias que
integram a competência legislativa privativa da União. Em se tratando de
competência legislativa privativa, apenas à União é dado editar normas sobre
tais matérias, na medida em que a competência legislativa privativa é exclusiva
e excludente.
O segundo aspecto diz
respeito àqueles assuntos que podem ser enquadrados simultaneamente em matérias
que integram a competência legislativa privativa da União e em matérias que
integram a competência suplementar dos municípios. Nesses casos, prevalece a
competência legislativa privativa da União — que, como se viu, é não apenas
exclusiva, mas também excludente — sobre a competência legislativa dos
municípios. Vale dizer, ainda que a matéria pudesse ser enquadrada na
competência legislativa suplementar dos municípios, uma vez que ela esteja
enquadrada também na competência legislativa privativa da União, ela só poderá
ser objeto da legislação federal.
Diante dos limites
constitucionais da competência legislativa dos municípios, impõe-se como
necessária a conclusão de que vários dos aspectos relativos ao serviço de
transporte remunerado privado individual de passageiros intermediado por
aplicativos escapam da competência legislativa dos municípios.
Esse é o caso
daqueles aspectos em relação aos quais não se vislumbra qualquer “interesse
local”, como aquele relativo à exigência de uma idade máxima para os veículos —
afinal, não há razão para em determinado município os veículos possuírem idade
limite diferente daquela aplicável aos demais municípios. É o caso também daqueles
assuntos que integram a competência legislativa privativa da União, por dizerem
respeito a Direito Civil ou do Trabalho ou a trânsito e transporte.
Como se vê, portanto,
apesar da largueza que a Lei nº 13.640/2018 pretendeu dar à competência dos
Municípios para regulamentar o serviço de transporte remunerado privado
individual de passageiros, a atividade legislativa dos municípios não terá toda
essa amplitude, devendo obedecer aos limites que lhe são impostos pela
legislação federal.
Advogado Henry
Gonçalves Lemmertz
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