segunda-feira, dezembro 31, 2018

*Chegou a hora de parar

A partida

          Jota Parente - Parei. 53.874 km percorridos depois de quatro expedições, é hora de parar com as aventuras pelas estradas da América do Sul, continente no qual só ficou faltando conhecer os três países do extremo norte, que são a Guiana, o Suriname e a Guiana Francesa, essa última, possessão francesa.
          Tudo começou em setembro de 2007 quando recebi minha primeira moto Yamaha XTZ 125, na Cimaq Motos. Assim, de repente, conversando com minha mulher Marilene, disse que gostaria de fazer uma viagem de moto pela América do Sul. Ela falou na ocasião que iria comigo, e ficamos acertados que seria dessa forma.
Eu não fazia a menor ideia do tamanho do desafio, embora imaginasse que fosse uma jornada longa, que exigiria um bom planejamento, tanto no aspecto financeiro, quanto no preparo físico e psicológico. E foi desse jeito que começou a saga do aventureiro Jota Parente pelas mais diversas estradas sul-americanas, de norte a sul, de leste a oeste.
A mais recente e também última expedição foi a mais exaustiva de todas sob todos os aspectos. O menor tempo de preparação exigiu uma enorme correria para viabilizar financeiramente a jornada; a necessidade correr atrás de um número maior de apoiadores face às dificuldades da economia local e a distância a ser percorrida em um tempo que não poderia ser longo tornaram a Expedição ao Fim do Mundo um desafio único.
Percorri 16.207 km em 22 dias montado na potente Honda CB Twister 250, posto que a expedição durou exatos 25 dias. Os outros três dias, dois eu gastei na ida e na volta de ônibus de Castelo de Sonhos, para onde a Tapajós Honda Motos, através do gerente Edson Uchoa, mandou levar e trouxe de volta. O outro dia fiquei no hospital da cidade onde caí.
Passagem por Florida, Uruguai, terra de Armando Miqueiro
Fiz uma média de 737 km por dia. Como essa foi a média, houve dias que eu percorri menos, enquanto em outros andei bem mais que isso. Quando eu parava no final do dia para descansar, planejava onde iria dormir no dia seguinte. Na maioria das vezes eu consegui cumprir a meta, porém, às vezes as dificuldades não permitiram, e a mais severa de todas as dificuldades foi sempre o tempo, sobretudo quando entrei na região do frio.
Quando eu falo de frio, estou falando de um frio inclemente que diminuiu um pouco nessa época, mas, que não para nunca. Quando converso com as pessoas sobre isso, brinco dizendo que na Patagônia só existem duas temperaturas: fria e mais fria. Brincadeira à parte, é isso mesmo. Mais adiante terei oportunidade de falar com detalhes do frio e do vento que não para.
Mesmo antes de receber minha moto zero, depois de me informar com motoristas que viajam pela Santarém-Cuiabá rumo ao Mato Grosso, já havia decidido que não começaria a viagem em Itaituba, porque as informações das condições da estrada até Castelo de Sonhos não eram nada animadoras. Alguns trechos estão em péssimas condições, bem pior do que eu imaginava. E vai além de Castelo, chegando à altura de Cachoeira da Serra.
Catedral de Montevidéu
No feriado de 15 de novembro eu peguei o ônibus da Ouro e Prata, das seis da manhã. Viagem longa, que se entendeu até às 18:20 para percorrer os 544 km que separam Itaituba daquele distrito de Altamira. Menos mal porque choveu pouco, o que permitiu passar no trecho de terra que tem provocado filas enorme de carretas, entre Moraes Almeida e a cidade de Novo Progresso.
Ansioso para começar a viagem de moto, levantei cedo no dia 16, tomei café no hotel e fui para a filial da Tapajós Honda Motos de Castelo aguardar a chegada da senhora Lídia, que me recebeu com muita atenção. Peguei a moto e voltei para o hotel para arrumar a bagagem no bagageiro. Às 9:15 estava tudo pronto para tentar pernoitar na cidade de Rosário Oeste, 846 km distante de Castelo e a 111 km de Cuiabá. Parei às 19:40 HS. O tempo e o tráfego na estrada ajudaram.
De Rosário Oeste saí cedo para chegar a Cuiabá num horário em que trânsito não estivesse muito pesado para evitar perder muito tempo. Com ajuda do GPS varei do outro lado da cidade sem maiores problemas. O objetivo a ser alcançado naquele 17 de novembro era o distrito de Anhanduí, 66 km depois de Campo Grande. Consegui vencer o 890 km parando às 20:20 HS.
Sempre para o Sul - O Sul era o meu destino, sempre para o Sul, mas, resolvi sair um pouco da rota para conhecer um pouco da cidade paraguaia de Pedro Juan Caballero, que fica na fronteira daquele país, separada pela cidade de Ponta Porã pela avenida Brasil, em Mato Grosso do Sul, no dia 18.
No Estádio Centenário, Montevidéu
Caballeros, como se fala por lá, é uma cidade com 115 mil habitantes, que tem o enorme Shopping China, que é uma loucura, tanto pela variedade de produtos importados, quanto pelo preço muito abaixo do praticado no Brasil. Pena que existe limite de valores para passar pela fronteira com compras. Nesse dia, dormi em Eldorado, Paraná, percorrendo 627 km por conta de um temporal do qual tive que me abrigar em Amambaí.
Andei pouco na segunda, 19 de novembro, porque gastei muito tempo em Toledo, no Paraná, dando assistência a moto numa concessionária Honda. Por isso, só consegui avançar 524 km, dormindo em Pranchita, ainda no Paraná, poucos quilômetros de distância da fronteira com a Argentina. Quando cheguei a essa cidade, minha jaqueta de viagem estava com o zíper danificado. Para minha sorte, o dono do hotel onde fiquei conhecia um sapateiro que morava meia hora adiante, o qual resolveu o problema.
Saí de Pranchita com a intenção de pernoitar em Rosário do Sul, com possibilidade de esticar até Santana do Livramento a 761 km. Só deu para chegar até Rosário, a 557 km. Não foi um bom dia na estrada. Dormi em uma cabana nos fundos de um posto de gasolina, um lugar legal para descansar. Bem cedo levantei para seguir para a fronteira, pois sabia que precisava de um tempo para trocar o óleo da moto e comprar a Carta Verde, o seguro da moto.
Já passava de meio-dia quando cruzei a fronteira. Precisava passar na migração do Uruguai. Pouca burocracia. Por volta de uma da tarde já estava na Ruta 5, uma excelente rodovia. Parei em Tacuarembó, primeira cidade depois da fronteira, e Florida, cidade onde nasceu um grande amigo, Armando Miqueiro. Registrei a passagem e mandei-me rumo a Montevideo, em cuja orla já estava antes das sete da noite.
Com uma área de apenas 176 mil km quadrados, menor que o estado do Paraná, o Uruguai é um grande campo de produção de grãos, mas, principalmente, de criação de gado de boa qualidade. Quase 60% do território uruguaio é ocupado pela criação de bovinos e ovinos, tendo isso um peso importante na economia do país. O Uruguai é um dos poucos países não lusófonos em que o ensino da língua portuguesa é obrigatório. O Português é ensinado a partir do 6º ano de escolaridade.
Eu tinha dois pontos que não poderia deixar de visitar em Montevideo, capital da República Oriental do Uruguai: o Centro Histórico e o estádio Centenário. Como tinha me hospedado no centro da cidade, pude conhecer um pouco do comércio da capital. Não foi a mais agradável das noites, porque por falta de opção hospedei-me em um hotel onde só havia quarto compartilhado.
Como acontece em inúmeras cidades da América do Sul, os fundadores não tiveram o cuidado de construir a praça da catedral um pouco mais distante da igreja que costuma ser uma das construções mais antigas. Não se consegue fazer uma boa foto, a não ser com lentes especiais, não é possível fotografar a frente do templo dedicado à Imaculada Conceição, padroeira do povo católico do Uruguai e a San Felipe e Santiago, padroeiros da cidade de Montevidéu.
De Montevidéu fui até o extremo oeste do Uruguai, onde fica a bela cidade de Colônia de Sacramento. Cidade pequena, com cerca de 30 mil habitantes, fundada em 1680. Conserva sua arquitetura colonial, além de ser uma região praiana, onde os imóveis e os aluguéis são nada baratos.
Na próxima edição prosseguirei com o relato, descrevendo a entrada e as duas semanas que passei na Argentina, onde aconteceu de tudo, de bom e ruim.

Jota Parente

*Matéria publicada na edição 244 do Jornal do Comércio, circulando desde sexta-feira, 28/12/18

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