O
presidente da Assembleia Legislativa do Pará (Alepa), deputado
estadual Márcio Miranda (DEM) poderá ser processado por crime de
peculato e improbidade administrativa.
Segundo documentos obtidos
pelo DIÁRIO, ele teria se beneficiado de duas fraudes: uma quando
decidiu trilhar a carreira política; outra quando se aposentou da
Polícia Militar (PM) do Pará.
Pela
Constituição Federal, só militares com mais de 10 anos de serviço
é que podem ser colocados na condição de “agregados”, quando
se candidatam a um cargo eletivo. Temporariamente afastados, não
perdem nem a remuneração nem o vínculo. No entanto, Márcio
Miranda conseguiu ser colocado como agregado quando só possuía 6
anos na PM-PA. E, de quebra, ainda conseguiu se aposentar antes de
completar 10 anos na ativa. A aposentadoria dele custa aos cofres
públicos mais de R$ 6,6 mil brutos por mês.
O
caso promete: na últimas sexta-feira (13), o Diário Oficial do
Estado publicou a portaria de instauração do Procedimento
Investigatório Criminal (PIC) 000216-104/2018, pelo 2º promotor de
Justiça Militar, Armando Brasil. Segundo a portaria, o PIC vai
apurar “possíveis ilícitos penais acompanhados de provas
documentais em tese, previstos nos arts. 251 (estelionato) e 303
(peculato) do Código Penal Militar, atribuídos a oficial da reserva
da Polícia Militar que atualmente exerce função parlamentar na
Assembleia Legislativa do Estado do Pará”. (Diário do Pará)
A
reportagem tentou, mas não conseguiu localizar Armando Brasil. No
entanto, tudo indica que o PIC é sobre as supostas fraudes que
teriam beneficiado Márcio Miranda. A fonte que entregou ao DIÁRIO a
documentação sobre as supostas fraudes envolvendo o presidente da
Alepa garantiu que havia encaminhado a denúncia ao Ministério
Público Militar.
Segundo
a documentação, Márcio Miranda foi admitido para estágio
probatório ao posto de primeiro tenente da PM (ele é médico)
através do Decreto 757, publicado no Diário Oficial do Estado de 20
de abril de 1992. Mas, nas eleições de 1998, decidiu se candidatar
a deputado estadual pelo PSDB, o partido que comandava o Governo do
Estado. Como não tinha 10 anos de serviço, deveria ter sido
demitido ou afastado “ex-officio”, sem remuneração.
AGREGADO
No
entanto, contrariando o artigo 14, parágrafo 8, da Constituição
Federal, ele foi colocado na condição de agregado. A irregularidade
ocorreu através do decreto 2866, de 10 de junho de 1998 (Diário
Oficial do Estado de 02/09/1998).
E,
como se não bastasse, ainda permaneceu durante anos como agregado,
apesar de não ter sido eleito (ficou como suplente) e recebendo a
remuneração de oficial da PM. Pela lei, os militares agregados, que
são derrotados nas urnas, voltam à ativa. Se eleitos, são mandados
para a aposentadoria, na data da diplomação para o mandato.
Na
verdade, Márcio Miranda permaneceu como agregado até se aposentar,
mas, como demonstram os documentos, também de forma irregular. Em 1
de fevereiro de 2002, ele assumiu o mandato de deputado estadual, no
lugar da ex-deputada tucana Lourdes Lima, que havia sido nomeada
conselheira do Tribunal de Contas do Estado (TCE). No entanto, só
completaria 10 anos de serviço dois meses depois (ele entrou na PM
em abril de 1992).
Assim,
deveria ter sido demitido. Mas acabou é mandado para a reserva
remunerada, através da portaria 0681, da Secretaria Executiva de
Administração, datada de 30 de abril de 2002 (Diário Oficial de
06/05/2002). O fato lhe garantiu uma boa aposentadoria: ele recebe do
Instituto de Gestão Previdenciária do Pará (Igeprev) R$ 6.642,69
brutos por mês. O soldo mesmo é inferior a R$ 2 mil. Mas são
vários os penduricalhos que elevam esse valor para mais de R$ 6 mil.
Entre eles, uma gratificação por “risco de vida” e outra por
“tempo de serviços militares”. Tudo isso, é claro, além da
remuneração de deputado estadual.
Benefício
contraria o que diz a Constituição
Ainda
segundo a fonte ouvida pelo DIÁRIO, é bem provável que Márcio
Miranda tente alegar que poderia ter sido, sim, agregado em 1998, já
que o Estatuto da PM-PA prevê a possibilidade de agregação de
militares-candidatos com 5 anos de serviço, como também prevê o
estatuto das Forças Armadas.
“O
problema é que esses estatutos são anteriores à Constituição de
1988 e os dispositivos que preveem esses 5 anos acabaram revogados
por ela”, explica. E cita como exemplo uma decisão de outubro de
2014 do Tribunal de Justiça do Estado de Roraima. Nela, o tribunal
negou o recurso de um militar que decidiu se candidatar a um cargo
eletivo, mas, como possuía menos de 10 anos de serviço, acabou
demitido.
AFASTAMENTO
De
acordo com a sentença, o afastamento dos militares, em tais casos, é
definitivo e deve acontecer através de demissão ou licenciamento ex
officio, como constam em precedentes (decisões anteriores) do
Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e até do Supremo Tribunal Federal
(STF), a mais alta Corte de Justiça do País.
Na
opinião da fonte, ao continuar a receber ilegalmente o soldo de
militar, Márcio Miranda cometeu crime de peculato (quando um
servidor público se apropria de bens ou recursos públicos) e pode
também ser enquadrado em improbidade administrativa. “Isso dá
prisão”, afirma. “Desde 1998, ele (o deputado) não poderia
estar recebendo remuneração como militar. E deve é ser condenado a
devolver todo esse dinheiro ao erário”.
Situação
semelhante com desfecho diferente
Segundo
uma fonte ouvida pelo DIÁRIO, há vários casos de militares com
menos de 10 anos de batente que resolveram disputar eleições e
acabaram demitidos. “Só eu conheço 5”, comenta. “E se isso
ainda é raro é porque só agora é que vemos o surgimento de
militares candidatos”. A fonte aponta como “emblemático” o
caso do soldado Tércio Junior Sousa Nogueira, o Soldado Tércio.
PORTARIA
Em
julho de 2014, Tércio foi licenciado ex-officio e excluído da folha
de pagamento da PM, através da Portaria 1140/2014, do Comando Geral,
porque havia se candidato a deputado estadual. Ou seja: a situação
de Tércio, embora semelhante a de Márcio Miranda, teve um desfecho
bem diferente. “Talvez porque o Tércio, que foi eleito com mais de
32 mil votos, não seja do PSDB ou do DEM, mas do PROS e se mostre um
crítico da política de Segurança do governador”, observa.
(Ana
Célia Pinheiro)
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