
Quando alguém como Eliane, um
ser humano muito querido por todos que a conheceram é retirado brutalmente do
convívio dos seus familiares, do meio dos seus colegas de trabalho e do círculo
de suas amizades, alivia um pouco quando a polícia age rapidamente, colocando
atrás das grades bandidos tenebrosos como esses. Mas, não para por aí.
Durante décadas e mais décadas,
dizia-se, no Brasil, que só ia para a cadeia, ladrão de galinha, pois quem
tinha dinheiro contratava um bom advogado e ficava livre. Hoje em dia, depois
que o MPF, trabalhando em perfeita sintonia com a Justiça, mandou muito
engravatada para a cadeia, os ricos ficaram com medo de ir em cana. O medo
passou para o andar de baixo; pelo menos em muitos lugares onde o cidadão
perdeu a confiança nas instituições ligadas à segurança pública.
Gente graúda da segurança pública, em Itaituba,
em conversas reservadas com vereadores, e até com gente da imprensa, tem
confidenciado que não dá para fazer mais do que está sendo feito, por falta de
condições. Quando tem carro, não tem combustível, quando tem combustível, o
carro prega. Fora o problema do armamento obsoleto que é entregue aos policiais
que vão para as ruas combater a bandidagem. E de quebra, ainda há um bom número
de denúncias sobre a atuação inescrupulosa de alguns maus policiais, que
deveriam ser expurgados de suas corporações.
Segurança pública é uma obrigação do governo do
estado. Entretanto, a comunidade não deve apenas trancafiar-se em casa para
fugir do perigo. Deve ter coragem de criticar quem tem que ser criticado,
cobrando de forma organizada, por meio de manifestações e de documentos uma
solução. Temos que cobrar, sim, dos políticos locais, mas, cobrar com
responsabilidade, sem ficar apenas jogando para a plateia.
Os primeiros a serem cobrados devem ser os deputados
estaduais que mais votos obtiveram neste município, sendo Hilton Aguiar e
Eraldo Pimenta, pela ordem, os que mais explicações devem ao povo de Itaituba
sobre o que estão fazendo a esse respeito. Em seguida, o foco deve voltar-se
para os políticos com mandatos eletivos, que atuam dentro da circunscrição do
município, prefeito e vereadores.
Dar entrevistas no auge da comoção que toma
conta de todos, como aconteceu no caso do assassinato da Eliane é
compreensível, mas, não resolve, pois, com o passar do tempo o volume dos
protestos vai baixando, baixando, até ficar inaudível. E aí, volta tudo a ser
como antes, e fatos revoltantes como esse passam a ser apenas um dado
estatístico.
É comum ouvirmos dizer: ah, a polícia prende e
a justiça solta logo depois; ah, a culpa é da polícia, que não faz o seu
trabalho direito, deixando brechas para que os advogados tenham condições de
argumentar pela soltura, por pior que tenha sido o crime. Há muitos que botam a
culpa na parafernália que é o arcabouço jurídico do País, com suas mais de 180
mil leis, que permite essa esculhambação toda.
Todo mundo tem culpa; uns, um pouco mais;
outros um pouco menos. Mas, se tivermos que apontar o dedo para quem tem mais
culpa, o Congresso Nacional é o maior culpado, pois faz algumas décadas que se
fala na necessidade urgente de se fazer uma reforma no nosso arcabouço
jurídico, discussão na qual pouco tem se avançado. O Código de Processo Penal,
cujo projeto está desde 2012 no Senado é considerado muito ruim, já deveria ter
sido resolvido. Mas, continua lá.
Enquanto aqueles senhores engravatados, de
Brasília, que contam com segurança pública e privada, não se tocarem de que
também eles vivem no Brasil, e de que seus eleitores clamam por uma justiça
justa, quantas Eliane terão que ser brusca e tão brutalmente assassinadas até
que eles sofram um choque de realidade e ajam em favor do povo. E enquanto eu, como célula da sociedade, não sentir vergonha de mim mesmo, ao me olhar no espelho, afirmando que está tudo bem, quando não está, isso não vai mudar.
O cidadão de bem não aguenta mais ver esses vagabundos,
esses bandidos cruéis, fazerem pouco da nossa cara, entrando e saindo de
delegacias pela porta da frente, rindo da cara da gente, enquanto nos sentimos indignados
e impotentes. Indignados e impotentes, mas, fazendo pouco para que seja diferente. E se sua morte, Eliane, não servir para nos despertar dessa
letargia, melhor, mesmo será nos trancamos em casa e pararmos de reclamar, pois
nossa covardia, enquanto sociedade, prevalecerá sobre o nosso sentimento de
indignação.
Jota Parente, editor responsável por este blog.
Esse artigo será publicado pelo Jornal do Comércio, próxima edição
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