O Liberal - Embora o governo do Estado determine uma
alíquota de 25% para fins de cobrança do Imposto sobre Circulação de Mercadoria
e Serviços (ICMS) nas faturas de energia elétrica, a Celpa, empresa do grupo
Equatorial, abocanha 38% de impostos dos paraenses. Isso significa que ela
arrecada 50% a mais sobre o tributo real, uma vez que aplica a cobrança do ICMS
“por dentro”, gerando peso maior que sua alíquota nominal, ou seja, a
concessionária impõe uma bitributação ao povo paraense. Entretanto, nem todas
as concessionárias do país adotam essa prática em relação a seus consumidores.
A
Companhia Elétrica de Brasília (CEB), por exemplo, aplica corretamente a
cobrança do ICMS, conforme estabelece o artigo 119 da Resolução 414/10 da
Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), parágrafo II, alínea 1ª,
determinado que a incidência dos tributos federais, estaduais, municipais ou do
Distrito Federal, deva incidir - única e exclusivamente - sobre o faturamento
do consumo de energia, e não sobre o total da conta faturada.
Isso significa que o paraense paga imposto
sobre imposto, pois a base de cálculo utilizada pela Celpa para recolher o ICMS
na conta de energia é sobre um montante que já inclui os valores cobrados de
outros tributos, estes federais, como PIS e Cofins. Essa discrepância acontece
exatamente em um dos principais Estados geradores de energia elétrica do
Brasil, o Pará, unidade federativa que assumirá a ponta do setor energético
nacional até 2020, com a construção da usina hidrelétrica de Belo Monte, na
região do Xingu, além das hidrelétricas de Marabá, na região de Carajás; e de
Jatobá e São Luís do Tapajós.
A
reportagem de O LIBERAL verificou em algumas contas que há bases de cálculo
diferentes para a definição do valor final a ser cobrado. Por exemplo, a alíquota
de 25% do ICMS deveria ter como base de cálculo o valor do consumo, mas no Pará
a referência engloba não apenas o valor do consumo, mas ainda valores do
próprio ICMS, Cofins e PIS e adicional de banda vermelha, entre outros itens.
Já em Brasília (DF), a alíquota do ICMS incide apenas sobre o valor do consumo
(base de cálculo).
Uma
conta que apresenta consumo de R$ 2.541,82 deveria ter como ICMS (25% sobre
esse valor) o montante de R$ 635,45, mas o valor cobrado pelo ICMS salta para
R$ 1.023,16. Ou seja, em vez de aplicar a alíquota de 25% sobre o consumo para
calcular o ICMS, a Celpa taxou 25% sobre o subtotal de R$ 4.092,66, onde já
está incluída a cobrança de valores do próprio ICMS, Cofins e PIS - o que
caracteriza bitributação -, para chegar ao valor do imposto, antes de
acrescentar a cobrança pela Contribuição de Iluminação Pública (CIP), de R$
85,54, totalizando uma conta a pagar no valor de R$ 4.178,20.
Ao
contrário do que foi verificado nesta conta de energia, em Belém, temos uma
exemplo na capital federal de uma conta de luz com um consumo de R$ 233,27,
acrescida da CIP de R$ 53,90, totalizando R$ 287,17 como valor a ser pago.
Nesse caso, a alíquota de 17% do ICMS (no Pará, a taxa é de 25%) incide
realmente sobre a base de cálculo do valor faturado como consumo - de R$
233,27. Em outras palavras, não incide sobre um subtotal em que aparecem
somados os demais tributos - PIS e Cofins - que também são cobrados a maior
pela Celpa.
O
biomédico Napoleão Alencar, ao analisar sua conta de energia elétrica,
conseguiu identificar uma cobrança dupla de tributos. “Eu considero essa soma
toda muito estranha; questiono como surgem esses números e penso que o
Ministério Público deveria atuar para esclarecer à população sobre essa
cobrança de tributos na conta de consumo de energia elétrica”, destacou.
Em
outra conta levantada pelo jornal, de um morador do bairro do Ariramba, em
Mosqueiro, o consumo de R$ 165,04 resultaria em uma cobrança de ICMS de R$
41,26, mas o valor taxado que aparece no documento é de R$ 66,35. Esse
valor incide não sobre o consumo, de R$ 165,04, mas sobre o subtotal (incluindo
ICMS, PIS e Cofins) de R$ 265,45. Ou seja, em vez de pagar R$ 41,26, o
consumidor pagou R$ 66,35 de ICMS, um aumento de R$ 25,09, ou seja, quase 38%
do valor do consumo, quando este deveria ser de 25%.
Outra
situação é de um consumidor residencial do bairro da Marambaia, com o total da
fatura de R$ 75,77 e ICMS de R$ 17,64, sobre uma base de cálculo de R$ 70,58 -
quando deveria ser sobre o consumo de R$ 43,23. Se o ICMS fosse calculado sobre
o valor desse consumo, o consumidor pagaria somente R$ 7,34 de ICMS, uma
diferença de R$ 10,30 em relação ao valor cobrado na fatura. na região Tapajós.
Enquanto o Pará amarga um nefasto passivo ambiental e um perverso impacto social
decorrente de um lastro de miséria provocado pelo desmatamento para a
construção desses empreendimentos para geração de energia a todo o país,
empresas como a Vinci Partners, plataforma que controla o Grupo Equatorial,
negociam novos investimentos milionários.
No ano passado, a Celpa rendeu de lucro aos
seus investidores o montante de R$ 345 milhões, ou seja, a concessionária de
energia elétrica arrecadou quase R$ 1 milhão por dia. Detentora de 96% do
controle acionário, a Equatorial encontrou um grande negócio em território
paraense, uma vez que a sucateada Rede, assim como a estatal Eletrobrás, se
desfizeram de suas ações.
Em
meio a uma nebulosa e nada transparente recuperação judicial, ocorrida no
segundo semestre de 2012, a holding nacional adquiriu a concessionária paraense
pela bagatela de R$ 1. Ao assumir, a empresa prometeu investir no Estado,
porém, ao invés disso, trouxe do Maranhão todos os serviços terceirizados, o
que inclui até agência de publicidade e a consultoria que controla as redes sociais
da empresa. Após quase três anos à frente da companhia elétrica no Pará, a
Equatorial destaca-se entre as quatro piores concessionárias do país na opinião
do consumidor paraense, segundo o Índice Aneel de Satisfação do Consumidor
(Iasc).
Não bastasse o desserviço prestado à
população, fato este comprovado pelos altos índices de reclamações nos órgãos
de defesa do consumidor, como o Procon, a Celpa vem sendo alvo permanente de
pressão do Ministério Público do Estado. No ano passado, a empresa foi obrigada
a assinar um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) que a proibia de lançar, por
mais de uma vez no ano, contas baseadas em estimativas pela média do
consumo residencial. Apesar disso, o que se verifica é que o acordo parece não
ter surtido efeito diante do elevado número de reclamações nas lojas de
atendimento da Celpa, onde os consumidores, não raro, exibem contas faturadas
em valores estratosféricos, sem que haja uma explicação plausível para o fato.
A Celpa, que detém uma das mais elevadas
tarifas do Brasil, também imputa ao consumidor que paga legalmente sua fatura
as perdas decorrentes dos furtos de energia praticados em diversas áreas do
Estado, principalmente em áreas de invasão, onde a fiscalização não consegue
coibir as ligações clandestinas e os investimentos da empresa são insuficientes
para atrair esses consumidores para a legalidade.
E
quem acaba pagando por esses investimentos para uma população que não dispõe de
condições financeiras por questões de ordem social é o consumidor paraense. De
acordo com os dados da Aneel, o índice médio das perdas no país é de 17%. No
Pará, no entanto, as perdas computadas pela Celpa Equatorial já chegam a 31%,
taxa que incide sobre o percentual de reajuste tarifário, elevando assim o
aumento pago por todos na conta de luz.
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