sábado, março 17, 2007

Pensata

Quando a rima é solução
Samuel Lima
Fonte: Blog do Jeso

Há muito se discute, em diferentes espaços públicos, a necessidade de a mídia adotar mecanismos que garantam democracia e pluralismo aos múltiplos atores sociais. A sociedade reconhece e legitima os fatos editados pelos meios de comunicação, conferindo-lhes importante papel na vida contemporânea.

O jornal "Folha de S. Paulo" (edição 11/3) parece finalmente ter encontrado a "pedra filosofal" da questão. A informação foi publicada na coluna do jornalista Marcelo Beraba, ombudsman: "De acordo com o comunicado, assinado pelo secretário de Redação de Produção, Vaguinaldo Marinheiro, um levantamento interno demonstrou que o jornal consulta poucas fontes para a realização de reportagens.

Mostrou também que ouvimos sempre as mesmas pessoas. A intenção é enriquecer ao máximo essas relações [de fontes] para que possamos diversificar as vozes no jornal". Para ele "é visível a pobreza de fontes e a ausência do contraditório".

Se há algo que a cultura jurídica pode oferecer, como vetor de qualificação ao jornalismo, é o conceito de "contraditório". Não um amontoado de frases soltas, mas o zeloso e exaustivo exercício de ouvir as fontes que têm informação e/ou opinião sobre determinado assunto – e publicar.

O diário paulista tem como princípio o pluralismo, assim explicado: "Numa sociedade complexa todo fato se presta a interpretações múltiplas, quando não antagônicas. O leitor deve ter assegurado seu direito de acesso a todas elas. Todas as tendências ideológicas expressivas da sociedade devem estar representadas no jornal". No limite, isto é um sonho a ser realizado em cada jornal diário deste país.

Algumas pesquisas fundamentam essa percepção que temos da falta de democracia e pluralismo na mídia. O estudo realizado pelo Centro de Estudos de Segurança e Cidadania – Cesec, da Universidade Candido Mendes, analisou a cobertura de crime e violência em nove jornais do Rio, Minas e São Paulo, durante cinco meses de 2004.

Os dados compilados por Beraba indicam: (a) somente 36,4% dos textos registravam mais de uma fonte; (b) 10,5% continham opiniões divergentes e 32,5% tinham como base apenas a polícia.

Outra pesquisa do mesmo Cesec, com oito jornais do Rio, em 2006, chegou a resultado parecido: (a) 36,5% das matérias tinham mais de uma fonte; (b) apenas 8,4% continham opiniões divergentes. Destaque negativo para o jornal "O Globo": 47% dos textos tinham só uma fonte e apenas 13,1% traziam opiniões variadas.

Um terceiro estudo realizado pela Agência de Notícias dos Direitos da Infância (ANDI), analisando jornais desde 2000 para avaliar coberturas de temas sociais (drogas, direitos humanos, cidadania, saúde, deficiências físicas, educação etc.) chegou ao seguinte resultado ponderado: (a) 10,12% dos textos abrigavam opiniões divergentes; (b) 89,88% eram de fonte única.

Trata-se de uma singela fotografia do que sai todos os dias na mídia. Quando um dos principais jornais diários do país (O Globo) tem quase metade de seus textos com fonte única, a pobreza de conteúdo transparece com toda força, profundamente sintonizada com a ausência do contraditório e repetição dos "especialistas" de sempre.

Nesses jogos de disputa do simbólico e da formação de opinião pública (e do público) jornalismo rima com pluralismo. Mais que simples rima é uma solução para que "instituições, organizações e vozes que hoje não encontram espaço para opinião ou para a difusão de informações possam se apresentar", como crê Beraba.

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(*) Jornalista, doutor em mídia e teoria do conhecimento pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e coordenador do Curso de Jornalismo do Bom Jesus/IELUSC.

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